Por que a Síria pode incendiar o Oriente Médio

Immanuel Wallerstein descreve o caos geopolítico da região e alerta: “não há mais controle; será preciso sorte, para evitar uma explosão”

Por Immanuel Wallerstein | Tradução: Antonio Martins | Imagem: Henri RousseauGuerra (1894)

Houve um tempo em que todos, ou quase todos os atores no Oriente Médio, tinham posições claras. Era possível antecipar, com alto grau de êxito, como este ou aquele ator reagiria a qualquer fato novo. Este tempo passou. Se examinarmos a guerra civil na Síria, perceberemos rapidamente não apenas que cada ator estabelece para si mesmo um largo leque de objetivos, mas também que cada um está envolvido em debates internos ferozes, sobre que posição deveria adotar.

No próprio interior da Síria, a situação oferece três opções básicas. Há quem apoie, por diversas razões, a manutenção do regime hoje no poder. Há os que desejem a chamada “solução salafista, na qual alguma forma de regime da sharia islâmica se estabelece. E existem os que não querem nenhum destes desfechos, preferindo uma solução em que o regime de Assad é derrubado mas não se instala, em seu lugar, um regime salafista. Continuar lendo

Mercado de armas, desconhecido e devastador

Soldados filipinos se posicionam para atacar rebeldes muçulmanos: armas ocidentais

Quase sem controle dos Estados e sociedades, um punhado de empresas fatura 1,7 tilhão de dólares/ano, alimentando indústria da morte e corrupção política e midiática

Por Renato Brandão,

Há pelo menos 70 mil anos o homo sapiens já era dotado da capacidade de produzir armas. Junto com a capacidade de desenvolver a linguagem e dominar o fogo, a construção de instrumentos acompanhou a espécie humana nas tarefas de conquistar e se consolidar por diversas regiões do planeta. Transformações posteriores, em especial após os períodos Paleolítico e Neolítico, abririam uma nova etapa da evolução do homem, culminando com a formação de pioneiras organizações sociais e o surgimento da escrita, colocando fim à Pré-história. Homens e armas evoluíram pela Antiguidade até os dias atuais, em uma história de mais de 5 mil anos que vai do uso de metal derretido para fazer espadas, flechas e lanças, até o domínio biológico, químico e nuclear para construir armas de destruição em massa capazes de aniquilar o planeta em poucos minutos e por várias vezes. Continuar lendo

Desenvolvimento e desigualdade: onde está o Brasil?

O avanço na distribuição da renda do país deve continuar e se manter perene. Precisa permanecer sendo uma bandeira dos governos vindouros.

José Carlos Peliano

O processo de desenvolvimento de um país é multifacetado econômica, social, institucional e politicamente. Entram em ação, entre outras instâncias, os donos do poder, seus prepostos, o conjunto da força de trabalho, as relações de mercado, as condições e regras atribuídas às instituições e os termos e canais do intercâmbio financeiro e comercial com o exterior. Continuar lendo

As perspectivas da economia mundial para 2014

Carta Maior conversou com John Bowler, diretor de Análise de Países da Unidade de Inteligência da The Economist, que apontou um panorama complicado em 2014

Marcelo Justo

Londres – Como todo começo de ano, este início de 2014 é rico em previsões para a economia mundial.  A maioria fala de um crescimento global de 3,6%, cerca de 0,7% mais que no ano passado. As análises econômicas se caracterizam por não acertar no alvo nesta arte quase impossível das previsões, mas para além das porcentagens manuseadas está claro que o mundo segue sem se recuperar da crise de 2008. Em 2013, a zona do euro ficou estagnada e os Estados Unidos cresceram um pouco com altos e baixos. A China desacelerou seu crescimento e até as chamadas economias emergentes, que tinham sustentado o crescimento em 2012, tiveram um desempenho modesto.

A Carta Maior conversou com John Bowler, diretor de Análise de Países da Unidade de Inteligência da revista The Economist, que apontou um panorama complicado para este 2014. Continuar lendo

A reinvenção da América Latina

Se até agora sua inserção com o resto do mundo esteve condicionada pela presença das potências imperiais, com o novo século começou a trilhar outro caminho

Luis Hernández Navarro (*)

Em 1958, o historiador mexicano Edmundo O’Gormam publicou um livro intitulado La invención de América, com o qual sacudiu a historiografia dedicada a documentar e explicar o descobrimento e a conquista americana. Inventar, significa, de acordo com o dicionário da Real Academia da Língua, achar ou descobrir algo novo ou não conhecido.

Em seu texto, O´Gormam explica, de maneira nova para seu tempo, a forma em que o relato sobre a história e o devenir do “novo continente” foi construído. Hoje, retomando essa imagem, podemos dizer que América Latina está se reinventando. Continuar lendo

O copo meio cheio ou meio vazio

A visão sobre a América Latina difere conforme se olhe a partir dos Andes peruanos ou dos vulcões mexicanos

Por um lado há maior maturidade, mas por outro persistem a corrupção, a criminalidade e uma perversa propensão à liderança carismática

Há alguns meses, Mario Vargas Llosa e eu travamos um diálogo sobre a América Latina na Universidade de Princeton. Ao longo de sua vida e em sua obra, sua visão tem sido pessimista, às vezes inclusive fatalista, mas em tempos recentes ela foi mudando, e essa mudança, parece-me, tem fundamentos na realidade. Na conversa, confrontamos nossas respectivas impressões. Ele vê o copo meio cheio; eu, o copo meio vazio.

Numa ideia básica concordamos: nossos países têm feito progressos notáveis nos últimos anos. Basta um mínimo de memória para apreciar que, em comparação à época dos golpes de estado, dos regimes militares e das guerrilhas, dos anos das inflações estratosféricas e das espetaculares quebras, a América Latina apresentou (em geral) uma maturidade sem precedentes na sua infeliz história. Nossa tendência à anarquia e à ditadura derivou em um respeito ao menos formal pela democracia eleitoral. Igualmente alentador foi o desempenho econômico em meio à crise global: sofremos seus efeitos, mas muitas economias mostraram uma solidez tão inesperada como invejável. Além disso, muitos Governos aprenderam a lição de não relegar os problemas sociais até que estourem, e executam programas de atendimento à população mais pobre e marginalizada. Continuar lendo

As 85 pessoas mais ricas do mundo têm o mesmo dinheiro que as 3,5 bilhões mais pobres

As pessoas mais ricas do mundo certamente não são conhecidas por andarem de ônibus, mas estes 85 indivíduos, que juntos controlam tanta riqueza quanto a metade mais pobre da população mundial, poderiam caber em um único biarticulado.

Quem expõe esse dado chocante é a Oxfam International, uma confederação de 13 organizações e mais de 3.000 parceiros que busca soluções para o problema da pobreza e da injustiça através de campanhas, programas de desenvolvimento e ações emergenciais.

Seu novo relatório adverte que as 85 pessoas mais ricas em todo o globo compartilham uma riqueza combinada de £ 1 trilhão (cerca de R$ 3,8 trilhões), enquanto 3,5 bilhões dos mais pobres dividem outro £ 1 trilhão. Continuar lendo

Economia de energia: tudo começa em casa

Com pouco esforço, a maioria de nós poderia cortar os gastos energéticos em 25% ou mais

por Peter Miller

A foto termográfica mostra onde há desperdício de energia nesta casa antiga de New Haven, no estado de Connecticut. As manchas vermelhas e amarelas indicam perda de calor; as novas janelas de vidro duplo aparecem em tom azulado e frio. Ao impedir a saída do calor, as janelas reduzem o custo do aquecimento da casa

Já sabemos qual é o meio mais rápido e mais barato de frear o aquecimento global: diminuir nosso consumo de energia. Com pouco esforço, a maioria de nós poderia cortar os gastos energéticos em 25% ou mais – beneficiando o planeta e nosso próprio bolso. Portanto, o que estamos esperando?

Há pouco, minha mulher, PJ, e eu começamos um novo tipo de dieta. Os cientistas concluíram que o planeta está se aquecendo num ritmo mais acelerado do que se previa, e que as consequências podem ser trágicas se não reduzirmos a emissão de dióxido de carbono e outros gases associados ao efeito estufa que contribuem para aquecer a atmosfera. Qual é a ajuda que cada um de nós pode dar? Com o crescimento explosivo das emissões na China, na Índia e em outros países em desenvolvimento, as medidas individuais de contenção de energia resultam de fato em alguma diferença? Continuar lendo

Petróleo verde

Produzir combustíveis a partir de plantas pode ajudar o planeta – mas falta superar obstáculos

por Joel K. Bourne

Vestido para se proteger de cortes e serpentes, cortador faz uma pausa em canavial de Cosmópolis (SP)

Quando Dario Franchitti levou sua máquina aerodinâmica, nas cores laranja e preto e com motor de 670 cavalos, à vitória na prova de Indianápolis 500 deste ano, o efusivo escocês tornou-se o responsável por uma das mais curiosas notas na história do esporte. Ele subiu ao pódio como o primeiro piloto a vencer a prova de automobilismo mais famosa dos Estados Unidos com um carro abastecido apenas com etanol – o translúcido e calórico álcool de milho produzido pelos americanos.

A adoção desse combustível pelos competidores na corrida de Indianápolis é apenas mais um sinal do estouro da boiada em direção aos biocombustíveis, substitutos da gasolina e do óleo diesel que são extraídos de plantas como milho, soja e cana-de-açúcar. Para os entusiastas, tais fontes renováveis de energia poderiam reanimar a economia rural, diminuir a preocupante dependência de petróleo e – o melhor de tudo – reduzir a quantidade cada vez maior de dióxido de carbono que lançamos no ar. Ao contrário do carbono liberado pela queima de combustíveis fósseis, que vem elevando sem parar o termostato da Terra, o carbono dos biocombustíveis provém da atmosfera, de onde é capturado pelas plantas durante seu período de crescimento. Em teoria, portanto, a queima de um tanque de etanol poderia até mesmo zerar a conta de carbono de um carro de competição em Indianápolis. Continuar lendo

Envelhecimento da população no Brasil: os novos velhos

O Brasil vive um processo de prolongamento da expectativa de vida. De onde sairão os recursos para garantir qualidade de vida aos idosos?

Léa Maria Aarão Reis (*)

O ano termina com notícias mais positivas para os idosos brasileiros. Depois de décadas de descaso, omissão e silêncio por parte do Estado, principalmente sobre a população pobre de mais idade, o Estatuto do Idoso, que completou dez anos em 2013, veio dispor na forma da Lei n. 10 741 diversas obrigações e prioridades relacionadas aos cidadãos com mais de 60 anos.

Lamentável é ver o Estatuto desrespeitado pela própria justiça, há pouco tempo, pelos mesmos funcionários que devem cumpri-la.  Pretensos guardiães da lei, funcionários de serviço público discriminaram e negaram atendimento prioritário devido por motivo de idade, como reza o Estatuto, ao ex-ministro José Dirceu.  A defesa do dirigente petista invocou a Lei 10 741 para que seu cliente fosse (ou não) autorizado, com mais rapidez, a trabalhar fora da penitenciária onde continua indevidamente encerrado em regime fechado. Deve-se levar em conta que esse era um caso de repercussão nacional. Continuar lendo