Genocídio Armênio: as consequências de 99 anos de negação e esquecimento

Reconhecimento do massacre e atual limpeza étnica em Kessab são chave para entender esse povo tão peculiar

“Eu gostaria de ver qualquer força deste mundo destruir esta raça, esta pequena tribo de pessoas sem importância, cujas guerras foram todas lutadas e perdidas, cujas estruturas foram todas destruídas, cuja literatura não foi lida, a música não foi ouvida, e as preces já não são mais atendidas. Vá em frente, destrua a Armênia. Veja se consegue. Mande-os para o deserto sem pão ou água. Queimem suas casas e igrejas. Daí veja se eles não vão rir, cantar e rezar novamente! Quando dois armênios se encontrarem novamente em qualquer lugar neste mundo, veja se eles não vão criar uma nova Armênia”, escreveu em 1935 o autor norte-americano de origem armênia William Saroyan.

Sobre todas essas desgraças, o escritor se refere principalmente ao primeiro genocídio do século XX, praticado pelos turcos contra os armênios há exatamente 99 anos. Mas o que faz o extermínio desta “pequena tribo de pessoas sem importância” algo digno de se lembrar? Geralmente, o ato de recordação de um massacre vem da necessidade de honrar seus mortos e manter latentes os acontecimentos para que estes não se repitam. Contudo, esse não é o caso dos armênios. Continuar lendo

Entenda por que o mundo não impediu o genocídio de Ruanda

Em 100 dias, 800 mil pessoas morreram no país africano.
Caso é exemplo de omissão de potências internacionais.

As mortes de ruandeses da etnia tutsi pela maioria hutu começaram antes de 1994, quando ocorreu o genocídio que deixou 800 mil mortos em 100 dias no país. Desde 1990, agências humanitárias e a ONU vinham documentando matanças isoladas e a deterioração da situação no país. Quando o genocídio efetivamente começou, as lideranças políticas foram também avisadas. Então por que, dias depois da retirada de estrangeiros, a ONU não aprovou uma intervenção militar? Por que, ao invés disso, diminuiu o número das forças de paz? Continuar lendo

Facebook: um mapa das redes de ódio

Pesquisa vasculha território obscuro da internet: as comunidades que clamam por violência policial, linchamentos, mortes dos “esquerdistas” e novo golpe militar

Por Patrícia Cornils, entrevistando Fábio Malini | Imagem: Vitor Teixeira

No dia 5 de março o Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic), da Universidade Federal do Espírito Santo, publicou um mapa de redes de admiradores das Polícias Militares no Facebook. São páginas dedicadas a defender o uso de violência contra o que chamam de “bandidos”, “vagabundos”, “assaltantes”, fazer apologia a linchamentos e ao assassinato, defender policiais, publicar fotos de pessoas “justiçadas” ou mortas violentamente, vender equipamentos bélicos e combater os direitos humanos.

Para centenas de milhares de seguidores dessas páginas, a violência é a única mediadora das relações sociais, a paz só existe se a sociedade se armar e fizer justiça com as próprias mãos, a obediência seria o valor supremo da democracia. Dentro dessa lógica, a relação com os movimentos populares só poderia ser feita através da força policial. Qualquer ato que escape à ordem ou qualquer luta por direitos é lido como um desacato à sociedade disciplinada. Um exemplo: no sábado, dia 8 de março, a página “Faca na Caveira” publicou um texto sobre o Dia Internacional das Mulheres no qual manda as feministas “se foderem”. Em uma hora, recebeu 300 likes. Até a tarde de domingo, 1473 pessoas haviam curtido o texto.

Abaixo o professor Fábio Malini explica como fez a pesquisa e analisa o discurso compartilhado por esses internautas. “O que estamos vendo é só a cultura do medo midiático passando a ter os seus próprios veículos”, diz ele. Explore as redes neste link. Continuar lendo

Copa no Brasil deixará ônus, e não legado, diz relatora da ONU

Para a urbanista Raquel Rolnik, o legado urbanístico que a Copa do Mundo vai deixar para o País não será significativo

Relatora especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU para o Direito à Moradia Adequada acredita que Copa não deixará legado significativo

Tidos pelo poder público como uma vitrine para o País e uma oportunidade de investimentos, os grandes eventos que serão realizados no Brasil acabaram servindo de estopim para uma série de reivindicações, que eclodiram nas agora conhecidas como jornadas de junho. Essas reivindicações seguem se desdobrando, causando dor de cabeça aos governantes e perplexidade aos estudiosos. No centro da questão, por sediar a final da Copa do Mundo e as Olimpíadas e fazer parte do imaginário estrangeiro do Brasil, a cidade do Rio de Janeiro e os seus 6 milhões de habitantes servem de laboratório, e se veem entre as promessas de uma cidade melhor e a realidade caótica de má qualidade dos serviços públicos e obras aquém do anunciado.

Para a urbanista Raquel Rolnik, professora da Universidade de São Paulo e relatora especial do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Direito à Moradia Adequada, que acompanha de perto o processo desde 2009, a principal discussão que se coloca é o direito à cidade e a necessidade de se investir em uma cidade realmente para todos. “Não é comprar casa, comprar moto. Tem uma dimensão publica essencial que é a urbanidade e que precisa ser resolvida”, afirma. Continuar lendo

Mercado de armas, desconhecido e devastador

Soldados filipinos se posicionam para atacar rebeldes muçulmanos: armas ocidentais

Quase sem controle dos Estados e sociedades, um punhado de empresas fatura 1,7 tilhão de dólares/ano, alimentando indústria da morte e corrupção política e midiática

Por Renato Brandão,

Há pelo menos 70 mil anos o homo sapiens já era dotado da capacidade de produzir armas. Junto com a capacidade de desenvolver a linguagem e dominar o fogo, a construção de instrumentos acompanhou a espécie humana nas tarefas de conquistar e se consolidar por diversas regiões do planeta. Transformações posteriores, em especial após os períodos Paleolítico e Neolítico, abririam uma nova etapa da evolução do homem, culminando com a formação de pioneiras organizações sociais e o surgimento da escrita, colocando fim à Pré-história. Homens e armas evoluíram pela Antiguidade até os dias atuais, em uma história de mais de 5 mil anos que vai do uso de metal derretido para fazer espadas, flechas e lanças, até o domínio biológico, químico e nuclear para construir armas de destruição em massa capazes de aniquilar o planeta em poucos minutos e por várias vezes. Continuar lendo

Suécia fecha 4 prisões e prova: a questão é social

Penas alternativas e investimento na ressocialização de detentos derrubaram a população carcerária e levaram ao fechamento de 4 prisões no país nórdico

por Lino Bocchini

Presídio Dois Rios, abandonado de Ilha Grande (RJ)

O jornal inglês The Guardian informou em sua edição de ontem que 4 prisões e um centro de detenção foram fechados na Suécia, pela Justiça daquele país, por falta de prisioneiros. O diretor de serviços penitenciários local, Nils Oberg, afirmou que o número de detentos estava caindo 1% ao ano desde 2004 e, de 2011 para 2012, caiu 6%.

Oberg e outras fontes ouvidas pelo jornal inglês acreditam que a queda do número de presos tem os seguintes motivos: 1) investimentos na reabilitação de presos, ajudando-os a ser reinseridos na sociedade; 2) penas mais leves para delitos relacionados às drogas e 3) adoção de penas alternativas (como liberdade vigiada) em alguns casos. Continuar lendo

Diplomacia “made in Brazil”

Reconhecido, no passado, por posições pacifistas e avesso às polêmicas, casos recentes evidenciam um novo modo de atuação do governo brasileiro nas relações internacionais

Maurício Barroso

A diplomacia brasileira ganhou as manchetes da grande imprensa após o resgate, no dia 23 de agosto deste ano, do senador boliviano Roger Pinto Molina do confinamento de 455 dias na embaixada em La Paz, pelo diplomata brasileiro Eduardo Saboia. Segundo alguns analistas e também de acordo com alguns editorias de jornais, o caso demonstra uma mudança de atuação do Ministério das Relações Exteriores, também conhecido como Itamaraty. Anteriormente reconhecido por suas posições pacifistas e estritamente jurídicas, ultimamente, o órgão tem sido mais “agressivo” nas relações bilaterais.

O caso gerou atrito diplomático entre Brasil e Bolívia e culminou com a demissão do então ministro das Relações Exteriores, o chanceler Antônio Patriota, que comentou desconhecer a ação de resgate de Molina. Além da operação de retirada do senador boliviano, outros acontecimentos são apontados, por analistas políticos, como uma diplomacia de ocasião. Por exemplo, a expropriação da refinaria da Petrobras na Bolívia, quando não houve esforços por parte do governo brasileiro para impedir a ação; a retirada do Paraguai do Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a não extradição do italiano Cesare Battisti, condena- do por homicídio naquele país. Continuar lendo

Os sete governos derrubados pelos EUA

J. Dana Stuster, do site Foreign Policy

A era de golpes apoiados pela CIA despontou de maneira dramática: um general norte-americano viaja até o Irã e encontra “velhos amigos”; dias depois, o Xá ordena que o primeiro-ministro Mohammed Mossadegh deixe seu cargo. Quando os militares iranianos hesitam, milhões de dólares são injetados em Teerã para corromper os apoiadores de Mossadegh e financiar protestos de rua. Os militares, reconhecendo que a balança do poder começou a pesar mais do outro lado, derrubam o primeiro-ministro, que vive o resto de sua vida sob prisão domiciliar. Este foi, como um documento da CIA atesta, “uma operação norte-americana do começo ao fim”, e um dos muitos golpes apoiados pelos EUA que aconteceram pelo mundo durante a segunda metade do século XX.

Alguns líderes, tanto ditadores quanto eleitos democraticamente, foram pegos em meio ao conflito entre EUA e URSS da Guerra Fria – uma posição que custaria seus postos (e, para alguns, suas vidas) conforme a CIA tentava instalar “seus homens” no comando dos estados. O governo dos EUA reconheceu publicamente algumas dessas ações secretas; na verdade, o papel da CIA no golpe de 1953 tornou-se público esta semana. Em outros casos, o envolvimento da CIA ainda está somente sob suspeita. Continuar lendo

10 países avançados com problemas extremamente primitivos

Todos nós já ouvimos a expressão “problemas de primeiro mundo”, irmão mais velho do “classe média sofre”. É um meme do Twitter, uma alfinetada desdenhosa dirigida a quem fica decepcionado porque seu moccachino não tinha era espuma o suficiente (ou qualquer outra coisa do gênero, que certamente não é um problema de verdade em face a outros muito piores). E embora os países mais avançados de fato tenham “problemas” que fariam as outras nações chorarem de inveja, existem algumas áreas onde até mesmo os ricos poderiam usar uma mão amiga. Confira:

10. A Rússia é um paraíso de senhores de escravos

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Polícia: para quê polícia?

Por que respostas da PM e governos, diante das manifestações e “black-blocs”, sugerem desejo de fechamento autoritário

Por Tânia Caliari,

Desde que começaram as manifestações de junho, um elemento perturbador insinuou-se no cenário brasileiro: o comportamento errático das PMs – especialmente as de São Paulo e Rio de Janeiro. As tropas, comandadas pelos governos estaduais e conhecidas por seu vínculo militar e truculência nas periferias, alternaram atitudes opostas, e aparentemente descoordenadas. Na maior parte do tempo, agiram com violência, que repetidas vezes chegou a níveis de selvageria. Porém, em diversas ocasiões, ausentaram-se por completo – assistindo impassíveis a atos como a tentativa de incendiar a Câmara Municipal do Rio, em 7 de outubro. Em algumas poucas oportunidades, a PM cumpriu seu papel e assegurou o direito constitucional de manifestação. Em outras, policiais disfarçados de manifestantes foram filmados atirando coquetéis molotov contra prédios públicos.

Que está por trás deste estranho conjunto de atitudes? Durante um mês, a reporter Tânia Caliari foi em busca de respostas. Encontrou-se com os “black-blocs”, no vão do MASP e nas escadarias da Câmara do Rio. Entrevistou autoridades policiais. Dialogou com pesquisadores e organizações de defesa dos direitos humanos. Ao final, produziu vasta reportagem, publicada na edição de outubro da revista “Retrato do Brasil

Tânia apurou e escreveu em agosto e setembro, quando o elemento principal das manifestações era o chamado “bloco negro” (a greve dos professores do Rio, por exemplo, não havia começado). Mas, ao invés de levar em conta apenas os confrontos entre a polícia e este grupo, a repórter procurou entender também seu contexto. Ao fazê-lo, chegou a observações mais profundas. Continuar lendo