A Aliança do Pacífico e seus progressos

O acordo de integração é o mais ambicioso e promissor das Américas

A Aliança do Pacífico (AP) é provavelmente o tema mais candente da atualidade na integração econômica da América Latina. Vejamos por quê. Criada há pouco mais de dois anos, ela prevê uma integração de grande envergadura entre Chile, Colômbia, México e Peru, e se tornou rapidamente o mais ambicioso e promissor acordo de integração nas Américas. Os encontros internacionais abordam o tema com grande interesse, como ocorreu na reunião do Fórum Econômico Mundial, no final de janeiro em Davos. Não é de se estranhar que 25 países tenham solicitado a condição de observadores da AP, entre eles Estados Unidos, Canadá, China e Japão, além de latino-americanos como Costa Rica, Panamá e Uruguai. A Costa Rica já formalizou sua solicitação de adesão à AP. Com um PIB combinado de mais de 2 trilhões de dólares, um mercado de 209 milhões de pessoas e quase 10.000 dólares de renda per capita, é um mercado muito interessante para os investidores locais e estrangeiros. Representa 35% do PIB da América Latina, maior que o Brasil em termos de população e produto interno bruto. E, como suas economias são muito abertas, a AP concentra mais de 41% do comércio da América Latina com o resto do mundo. Continuar lendo

Os acidentes de trânsito serão a nova praga do mundo emergente

A OMS calcula que os desastres viários causarão dois milhões de mortes em 2030 nos países em desenvolvimento e alcançarão a Aids como causa de óbitos

Carros e pedestres em Lagos, Nigéria.

Os acidentes de trânsito estão a ponto de se converter na nova epidemia dos países pobres e em vias de desenvolvimento. Por isso, a Organização Mundial de Saúde (OMS) deu o alarme. Se não se fizer nada para frear a tendência, as mortes anuais nas vias de circulação dessas áreas do mundo chegarão a dois milhões em 2030, e os acidentes de trânsito se situarão no mesmo nível que as mortes por Aids, que é uma das principais causas de mortalidade no mundo em desenvolvimento. Os acidentes, além do mais, implicam num gasto público equivalente “a 2% do PIB dos países desenvolvidos e até 5% nos demais”, segundo Steve Lowson, da ONG britânica Programa de Qualificação Internacional das Estradas (iRAP, na sigla em inglês). Continuar lendo

A emergência dos emergentes

Há apenas alguns anos os emergentes eram um pilar da economia mundial; agora, são uma ameaça

Os países emergentes são como os adolescentes: propensos aos acidentes. Caem, escorregam, se empurram, correm riscos desnecessários… Lógico que, tal como demonstraram há pouco os EUA e a Europa, às vezes as nações maduras também se comportam de maneira imatura. Seus acidentes são menos frequentes, mas quando acontecem são de enormes proporções. O mundo ainda está pagando com o desemprego e a pobreza as irresponsáveis audácias financeiras de bancos, Governos e consumidores dos países mais ricos. E agora surge uma crise nos emergentes, esses países de menores rendimentos cujas economias e o bem-estar da população vinham expandindo a um ritmo sem precedentes.

Há duas perguntas de cujas respostas depende o prognóstico da economia mundial. Primeira: contagiarão as economias emergentes as economias dos países desenvolvidos ? Segunda: os investidores diferenciarão os países emergentes “bons” dos “maus”? Em outras palavras, retirarão seu dinheiro e deixarão de investir por um tempo em todos os países emergentes sem fazer distinções ou serão seletivos? Mas o que significa “mau” ou “bom” neste caso? Um governo “mau” é aquele que sofre de necrofilia ideológica: um apaixonado amor por ideias mortes; por enfoques que foram provados e que fracassaram repetidamente, mas pelos quais os poderosos sentem uma irresistível atração. Um governo “bom”, em mudança, aprende com os erros e tende a adotar políticas que dão resultados e são sustentáveis no tempo. Continuar lendo

O Brasil, os EUA e o “Hemisfério Ocidental” (2)

Henry Kissinger encontra Augusto Pinochet: nos anos 1970, EUA substituíram proposta de intervenção militar, em caso de ameaça à sua hegemonia na América do Sul, por forma mais sutil de intervenção civil e militar “interna”

Para diplomacia norte-americana, manter supremacia sobre América do Sul continua sendo essencial. Por isso, prosseguirá tentativa de enfraquecer governos que Washington vê como “populistas”

Por José Luís Fiori

“A new form of nationalism may emerge, seeking national or regional
identity by confronting the United States. In its deepest sense,
the challenge 
of Western Hemisphere policy for the United States is
whether it can help bring about the world
envisioned by Free Trade Area of the Americas,
or whether the Western Hemisphere, for the first time in its history,
will break up into competing blocs;
whether democracy and free markets
will remain the dominant institutions
or whether there is a gradual relapse into populist authoritarianism.”

Henry. Kissinger “Does America Need a Foreign Policy?”

Henry Kissinger foi um formulador estratégico menos original do que Nicholas Spykman, mas em compensação ocupou inúmeras posições de governo e participou de algumas decisões internacionais que o transformaram numa das figuras mais importantes da política externa norte-americana, da segunda metade do século XX. Ele deixou a academia e se transformou em conselheiro governamental, no primeiro governo de Eisenhower, em 1953, e manteve presença nos governos republicanos até o final das administrações de Richard Nixon e Gerald Ford, de quem foi Conselheiro de Segurança, e Secretario de Estado, respectivamente. Neste último período, Henry Kissinger teve papel decisivo na redefinição da estratégia internacional dos EUA, depois da crise econômica do início dos anos 70, e depois da derrota americana no Vietnã, em 1973. Foi quando ele concebeu ou participou de algumas decisões norte-americanas que deixaram marcas profundas na história da diplomacia internacional. Entre elas, a das negociações de paz, no Vietnã, que levaram à assinatura dos Acordos de Paris, em 1973; e a das negociações secretas com Chou en Lai e Mão Tse Tung , em 1971 e 1972, que levaram à reaproximação dos Estados Unidos com a China, e a reconfiguração completa da geopolítica mundial antes e depois do fim da Guerra Fria. Continuar lendo

O Brasil, EUA e o “Hemisfério Ocidental”

Washington deve sufocar militarmente ações comuns da América do Sul, propôs teórico geopolítico norte-americano mais influente no século XX. Em que medida proposição prevalece?

Por José Luis Fiori

As terras situadas ao sul do Rio Grande constituem
um mundo diferente do Canadá e dos Estados Unidos. 

E é uma coisa desafortunada que as partes de fala inglesa e latina
do continente 
tenham que ser chamadas igualmente de América, 
evocando similitudes entre as duas que de fato não existem

N. Spykman, “America´s Strategy in World Politics”

Tudo indica que os Estados Unidos serão o principal contraponto da política externa brasileira, dentro do Hemisfério Ocidental, durante o século XXI. E quase ninguém tem dúvida, também, de que os EUA seguirão sendo, por muito tempo, a principal potência militar, e uma das principais economias do mundo. Por isto é fundamental compreender as configurações geopolíticas da região, e a estratégia que orienta a política hemisférica norte-americana, deste início de século. Continuar lendo

O copo meio cheio ou meio vazio

A visão sobre a América Latina difere conforme se olhe a partir dos Andes peruanos ou dos vulcões mexicanos

Por um lado há maior maturidade, mas por outro persistem a corrupção, a criminalidade e uma perversa propensão à liderança carismática

Há alguns meses, Mario Vargas Llosa e eu travamos um diálogo sobre a América Latina na Universidade de Princeton. Ao longo de sua vida e em sua obra, sua visão tem sido pessimista, às vezes inclusive fatalista, mas em tempos recentes ela foi mudando, e essa mudança, parece-me, tem fundamentos na realidade. Na conversa, confrontamos nossas respectivas impressões. Ele vê o copo meio cheio; eu, o copo meio vazio.

Numa ideia básica concordamos: nossos países têm feito progressos notáveis nos últimos anos. Basta um mínimo de memória para apreciar que, em comparação à época dos golpes de estado, dos regimes militares e das guerrilhas, dos anos das inflações estratosféricas e das espetaculares quebras, a América Latina apresentou (em geral) uma maturidade sem precedentes na sua infeliz história. Nossa tendência à anarquia e à ditadura derivou em um respeito ao menos formal pela democracia eleitoral. Igualmente alentador foi o desempenho econômico em meio à crise global: sofremos seus efeitos, mas muitas economias mostraram uma solidez tão inesperada como invejável. Além disso, muitos Governos aprenderam a lição de não relegar os problemas sociais até que estourem, e executam programas de atendimento à população mais pobre e marginalizada. Continuar lendo

2013 em imagens: a versão da Agência Reuters

Em setenta fotos, um ano de desastres naturais, violência e medo — mas também protestos, transformações no quotidiano e esperança 

RAFAEL MARCHANTE, Portugal

JIM URQUHART, United States Continuar lendo

Um ano difícil para os governos progressistas da América Latina

Chega ao fim um ano que apresentou importantes dificuldades para os governos progressistas de nossa região. O caso mais emblemático é o venezuelano.

Ariel Goldstein

Chega ao fim um ano que apresentou importantes dificuldades para os governos progressistas de nossa região. Ao final do ano, o triunfo de Michelle Bachelet no Chile foi uma das poucas notícias positivas para a esquerda regional. O caso mais emblemático no que diz respeito à debilidade que mostram certos processos políticos é o venezuelano. A polarização vivida no país, a política de trincheiras entre chavistas e antichavistas, acentuada a partir da vitória apertada de Nicolas Maduro nas eleições de 14 de abril, se soma a uma crise econômica com efeitos inflacionários, de modo que será preciso seguir observando esse processo político com atenção para avaliar as suas possibilidades de continuidade.

No Equador, no início do ano, houve uma vitória folgada de Rafael Correa nas eleições presidenciais. Correa é uma liderança que combina o manejo de qualidades tecnocráticas com as virtudes do líder carismático, duas condições difíceis de encontrar juntas. A direção do processo político equatoriano encontra-se firme. Continuar lendo

Chile: a hora de Michelle Bachelet

Presidente pela segunda vez, ela promete agora governo de reformas e desprivatizações. Falou em nova Constituição. Terá ânimo e força para tanto?

Por Mercedes López San Miguel | Tradução Inês Castilho

Os símbolos ensinam sobre o momento que vive o Chile. Michelle Bachelet, filha de um general leal a Allende, ganhou de forma esmagadora, com 62,16% dos votos, de Evelyn Matthei, filha de um general pinochetista, que obteve 37,83% dos sufrágios. Ocorreu a quarenta anos do golpe militar contra o líder socialista. Diante de seus seguidores, reunidos em frente a um hotel no centro de Santiago, Bachelet prometeu realizar as reformas necessárias para fazer do Chile um país mais justo. “Hoje iniciamos uma nova etapa. É um privilégio conduzir a pátria num momento histórico, no qual o país olhou para suas feridas e viu as tarefas pendentes. Graças aos jovens que reclamaram um modelo de educação sem lucro. Porque os sonhos não são um bem de mercado.” Continuar lendo

ESPECIAL 40 ANOS DO GOLPE NO CHILE – CARTA MAIOR – 5 matérias

Chile e a experiência do Poder Popular

Mauro Iasi, no Blog da Boitempo

“Porque esta vez no si trata
De cambiar un presidente
Será el pueblo que construya
Un Chile bien diferente”

Falando-nos sobre as características da revolução proletária, Marx disse certa vez que nossas revoluções “encontram-se em constante autocrítica, (…) retornam ao que aparentemente conseguiram realizar, para recomeçar tudo de novo, (…) parecem jogar seu adversário por terra somente para que ele sugue dela novas forças e se reerga diante delas em proporções ainda mais gigantescas” (O 18 de brumário de Luís Bonaparte, p.30). De fato não se aprende com o passado a não ser o que deveríamos ter feito no passado. O que importa no estudo de nossa experiência de classe pregressa é descobrir os caminhos por onde passou o futuro em construção, os impasses e erros que nos distanciaram de nossa meta, para, assim, olhar para frente com mais segurança. Nossa revolução não tira sua poesia do passado, mas do futuro, como também disse o velho mestre, pois se antes a frase vazia das revoluções burguesas iam além do conteúdo, agora é o conteúdo proletário que não cabe na fraseologia vazia do ideário burguês.

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