O futuro da água brasileira será decidido nos tribunais?

Mesmo com um décimo da água potável do mundo, país já tem um conflito por água a cada quatro dias; além de mais frequentes, disputas vêm ganhando proporções inéditas.

O rio Paraíba do Sul está no centro da maior disputa por recursos hídricos que se tem notícia no país

O Brasil detém pouco mais de um décimo das reservas de água potável do mundo, no entanto, o país já registra um conflito por água a cada quatro dias, segundo o mais recente relatório da Comissão Pastoral da Terra, órgão ligado à Igreja Católica, obtido com exclusividade pela BBC Brasil. Em 2013, foram registradas 93 disputas locais em 19 Estados, 17% a mais do que no ano anterior. Mas esses conflitos não estão se tornando apenas mais frequentes. Também vêm assumindo dimensões inéditas.

Há pouco mais de uma semana, os governos de São Paulo e Rio de Janeiro vivem um embate. A razão é o projeto de São Paulo de captar água do Rio Paraíba do Sul e levá-la ao sistema Cantareira, grupo de reservatórios que abastece 15 milhões de pessoas na região metropolitana de São Paulo e no interior do Estado. O problema é que este rio já abastece outras 15 milhões de pessoas no Grande Rio e no interior paulista. O governo fluminense é contra a proposta. Desde então, Rio e São Paulo trocam farpas e ameaças de processo publicamente. Continuar lendo

Facebook: um mapa das redes de ódio

Pesquisa vasculha território obscuro da internet: as comunidades que clamam por violência policial, linchamentos, mortes dos “esquerdistas” e novo golpe militar

Por Patrícia Cornils, entrevistando Fábio Malini | Imagem: Vitor Teixeira

No dia 5 de março o Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic), da Universidade Federal do Espírito Santo, publicou um mapa de redes de admiradores das Polícias Militares no Facebook. São páginas dedicadas a defender o uso de violência contra o que chamam de “bandidos”, “vagabundos”, “assaltantes”, fazer apologia a linchamentos e ao assassinato, defender policiais, publicar fotos de pessoas “justiçadas” ou mortas violentamente, vender equipamentos bélicos e combater os direitos humanos.

Para centenas de milhares de seguidores dessas páginas, a violência é a única mediadora das relações sociais, a paz só existe se a sociedade se armar e fizer justiça com as próprias mãos, a obediência seria o valor supremo da democracia. Dentro dessa lógica, a relação com os movimentos populares só poderia ser feita através da força policial. Qualquer ato que escape à ordem ou qualquer luta por direitos é lido como um desacato à sociedade disciplinada. Um exemplo: no sábado, dia 8 de março, a página “Faca na Caveira” publicou um texto sobre o Dia Internacional das Mulheres no qual manda as feministas “se foderem”. Em uma hora, recebeu 300 likes. Até a tarde de domingo, 1473 pessoas haviam curtido o texto.

Abaixo o professor Fábio Malini explica como fez a pesquisa e analisa o discurso compartilhado por esses internautas. “O que estamos vendo é só a cultura do medo midiático passando a ter os seus próprios veículos”, diz ele. Explore as redes neste link. Continuar lendo

Para compreender o “Decrescimento”

Movimento não é saudosista, nem anticivilizatório. Mas sustenta: sem rever padrões de consumo e produção, “progresso” resultará em desigualdade e devastação

Por Alan Bocato-Franco

Pouco frequente, ainda, no Brasil, um debate tomou corpo e expandiu-se rapidamente nos últimos anos, em paralelo ao desconforto com o capitalismo e seus impasses. Trata-se da ideia de “decrescimento”. “Outras Palavras” abordou-o em diversos textos, no passado — mas deu-lhe destaque especial em 10 de outubro. Um artigo do cientista político catalão Vicenç Navarro criticava “algumas teorias” do decrescimento. Em sua opinião, elas acabam reduzindo-se a um ambientalismo elitista e antissocial, ao sugerirem, diante de países em crise, a continuação das políticas de “austeridade”, que geram mais desemprego e desindustrialização.

O artigo de Navarro gerou importante polêmica, na seção de comentários dos leitores. “Outras Palavras” convidou um dos polemistas, Alan Bocato-Franco, a escrever uma réplica. O resultado foi melhor que a encomenda. Muito mais que polemizar com Navarro — com quem, aliás, parece compartilhar pontos de vista –, Alan traça, no texto a seguir, um importante panorama sobre a origem, sentido e história das teorias do “decrescimento”. Continuar lendo

CLT faz 70 anos com patrões e empregados brigando sobre hora extra

Setenta anos depois do início da vigência da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), legislação criada para proteger os empregados, o pagamento de horas extras é o principal motivo que leva trabalhadores à Justiça. De acordo com levantamento feito em abril pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), o tribunal contava com 34.360 processos sobre o assunto, cerca de 18% dentre 187.061 processos em tramitação.

Segundo Carolina Porfírio, analista do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, esse pedido é comum porque muitas empresas obrigam os trabalhadores a cumprirem uma jornada superior à permitida por lei (de 44h semanais e 8h diárias). “As empresas mascaram as horas extraordinárias simplesmente não pagando o valor ou pagando um valor menor do que o devido”, diz.

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As entranhas do declínio americano

Joseph Sitglitz explica: por que desigualdade, redução do Estado e rentismo financeiro produzem, além de injustiça, cada vez mais ineficiência

Por Joseph Stiglitz, em Vanity Fair | Tradução: Gabriela Leite

Vamos começar estabelecendo uma premissa básica: a desigualdade nos Estados Unidos aumenta há décadas. Todos estamos conscientes deste fato. Certas vozes na direita negam a realidade, mas analistas sérios, em todo o espectro político, reconhecem o fenômeno. Não vou elencar todas as evidências neste texto: basta lembrar que a diferença entre o 1% e os 99% é muito vasta quando a analisamos em termos de rendimento anual; e ainda maior quando observamos a riqueza — ou seja, o capital acumulado e outros bens. Continuar lendo

Robet Fisk: Guerra ao terror, a nova religião ocidental

Por que o ocidente não para de mandar bombas sobre os povos do Oriente Médio? E por que não para de mandar exércitos para ocupar terras dos muçulmanos, exatamente o que a Al-Qaeda deseja que se faça?

Por Robert Fisk, The Independent, UK. Original em “War on terror is the West’s new religion”. Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu e publicado no Redecastorphoto

Mohamed al-Zawahiri, irmão caçula do sucessor de Osama bin Laden, Ayman, fez declaração particularmente intrigante no Cairo, mês passado. Falando àquela maravilhosa instituição francesa Le Journal du Dimanche sobre o Mali, disse ao jornal que alertasse a França “e as pessoas racionais e razoáveis na França, para que não caiam na mesma armadilha em que caíram os norte-americanos. A França já é responsável por ocupar um país muçulmano. A França já declarou guerra ao Islã”. Jamais, em todos os tempos, a França recebeu aviso mais claro.

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