Saída de cena do Subcomandante Marcos reflete nova etapa do EZLN em Chiapas

O personagem, uma das ferramentas de comunicação dos zapatistas desde o levante de 1994, evidenciou a invisibilidade dada à população indígena mexicana

“Queria pedir paciência, tolerância e compreensão às companheiras, companheiros e companheiroas, porque essas serão minhas últimas palavras em público antes de deixar de existir”. Já era madrugada de 25 de maio quando os milhares de milicianos, insurgentes e bases de apoio do EZLN (Exército Zapatista de Libertação Nacional), perfilados e encapuzados no centro do caracol de La Realidad, puderam ouvir o discurso do Subcomandante Insurgente Marcos. Marcos falou sobre a morte do zapatista Galeano, assassinado durante ataques paramilitares no dia 2 de maio.

O que ninguém esperava é que a cerimônia de homenagem a mais um combatente que cai desde que o EZLN declarou guerra ao Estado mexicano, em 1º de janeiro de 1994, fosse marcar também a saída de cena de seu porta-voz e principal figura pública. A substituição pelo indígena Moisés, também Subcomandante, representa mais do que o fim de um “personagem”, como o próprio Marcos se define.

Ela é resultado de uma série de transformações pelas quais os neozapatistas passaram desde 17 de novembro de 1983, data em que o movimento foi fundado na Selva Lacandona de Chiapas. Na época, contavam com apenas seis membros –  cinco homens e uma mulher, sendo três indígenas e três mestiços – como Marcos, que só chegaria à Selva em 1984. Continuar lendo

Golpe de 64: ‘Marcha da Família com Deus pela Liberdade’ completa 50 anos; saiba quem a financiou e dirigiu

Tidas como protagonistas do movimento que depôs João Goulart, organizações femininas lideradas por mulheres de classe média eram, na verdade, financiadas e instruídas pelos homens da elite empresarial-militar que queriam derrubar Jango

Felipe Amorim e Rodolfo Machado

Há 50 anos, em 19 de março de 1964, era realizada na cidade de São Paulo a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”. Estima-se que entre 500 mil e 800 mil pessoas partiram às 16h da Praça da República em direção à Praça da Sé, no centro, manifestando-se em resposta ao emblemático comício de João Goulart, seis dias antes, defendendo suas Reformas de Base na Central do Brasil. Passaram à história como as genuínas idealizadoras e promotoras da marcha organizações femininas e mulheres da classe média paulistana. No entanto, por trás deste aparente protagonismo feminino às vésperas do golpe que deu lugar a 21 anos de regime ditatorial, esconde-se um poderoso aparato financeiro e logístico conduzido por civis e militares que tramavam contra Jango. Um detalhe: quase todos eram homens.

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Facebook: um mapa das redes de ódio

Pesquisa vasculha território obscuro da internet: as comunidades que clamam por violência policial, linchamentos, mortes dos “esquerdistas” e novo golpe militar

Por Patrícia Cornils, entrevistando Fábio Malini | Imagem: Vitor Teixeira

No dia 5 de março o Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic), da Universidade Federal do Espírito Santo, publicou um mapa de redes de admiradores das Polícias Militares no Facebook. São páginas dedicadas a defender o uso de violência contra o que chamam de “bandidos”, “vagabundos”, “assaltantes”, fazer apologia a linchamentos e ao assassinato, defender policiais, publicar fotos de pessoas “justiçadas” ou mortas violentamente, vender equipamentos bélicos e combater os direitos humanos.

Para centenas de milhares de seguidores dessas páginas, a violência é a única mediadora das relações sociais, a paz só existe se a sociedade se armar e fizer justiça com as próprias mãos, a obediência seria o valor supremo da democracia. Dentro dessa lógica, a relação com os movimentos populares só poderia ser feita através da força policial. Qualquer ato que escape à ordem ou qualquer luta por direitos é lido como um desacato à sociedade disciplinada. Um exemplo: no sábado, dia 8 de março, a página “Faca na Caveira” publicou um texto sobre o Dia Internacional das Mulheres no qual manda as feministas “se foderem”. Em uma hora, recebeu 300 likes. Até a tarde de domingo, 1473 pessoas haviam curtido o texto.

Abaixo o professor Fábio Malini explica como fez a pesquisa e analisa o discurso compartilhado por esses internautas. “O que estamos vendo é só a cultura do medo midiático passando a ter os seus próprios veículos”, diz ele. Explore as redes neste link. Continuar lendo

O rolezinho da juventude nas ruas do consumo e do protesto

Os “rolezinhos” levaram para dentro do paraíso do consumo a afirmação daquilo que esse mesmo espaço lhes nega: sua identidade periférica. Se quando o jovem vai ao shopping namorar ou consumir com alguns amigos ele deve fingir algo que não é, com os rolezinhos ele afirma aquilo que é!

por Renato Souza de Almeida

Os jovens têm criado formas cada vez mais interessantes de manifestação. Desde as jornadas de junho de 2013 – que levou às ruas milhares de brasileiros – até os chamados “rolezinhos” – que também vêm colocando centenas em circulação – se instalou uma crise na análise daqueles que insistiam em afirmar uma possível apatia dessa geração juvenil.

“Sair de rolê…” significa dar uma circulada despretensiosa pela vila ou pela cidade. É possível dar um rolê de trem, de ônibus ou a pé. Geralmente, o rolê está ligado ao lazer ou a alguma prática cultural. Sai de rolê o pichador, o skatista, o caminhante… O que vem chamando a atenção de muita gente é como um simples gesto de sair e circular de forma livre tem ocupado um papel central nas principais mobilizações juvenis na cidade de São Paulo nos últimos tempos. Continuar lendo

O que realmente é o fascismo

por Lew Rockwell

Todo mundo sabe que o termo fascista é hoje pejorativo; um adjetivo frequentemente utilizado para se descrever qualquer posição política da qual o orador não goste.  Não há ninguém no mundo atual propenso a bater no peito e dizer “Sou um fascista; considero o fascismo um grande sistema econômico e social.”Porém, afirmo que, caso fossem honestos, a vasta maioria dos políticos, intelectuais e ativistas do mundo atual teria de dizer exatamente isto a respeito de si mesmos.O fascismo é o sistema de governo que carteliza o setor privado, planeja centralizadamente a economia subsidiando grandes empresários com boas conexões políticas, exalta o poder estatal como sendo a fonte de toda a ordem, nega direitos e liberdades fundamentais aos indivíduos e torna o poder executivo o senhor irrestrito da sociedade.

Tente imaginar algum país cujo governo não siga nenhuma destas características acima.  Tal arranjo se tornou tão corriqueiro, tão trivial, que praticamente deixou de ser notado pelas pessoas.  Praticamente ninguém conhece este sistema pelo seu verdadeiro nome. Continuar lendo

Geração Y: superpreparados e frustrados

Muitos jovens nascidos entre os anos 80 e 90 entram no mercado de trabalho com falta de perspectiva e expectativas equivocadas, segundo especialistas

“O jovem de hoje acha que a vida é uma festa openbar”

Vestibular da UNICAMP em janeiro.

Terminar o colegial. Passar no vestibular. Concluir a faculdade. Entrar no mercado de trabalho. Crescer na empresa. Se especializar. O que foi durante décadas o caminho natural da vida adulta para 12% da população brasileira que completou o terceiro grau, segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), não parece ser para os jovens da geração Y. “Eles acham que o roteiro é passar no vestibular, conseguir um estágio e ter êxito profissional, mas quando chegam ao mercado, não têm experiência de vida e não estão acostumados a ouvir ‘não’”, afirma Ademar Bueno, diretor do Laboratório de Inovação, Empreendedorismo e Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (FGV). A FGV é uma faculdade privada de onde saem diretores e presidentes de empresas. As mensalidades podem superar os 4.000 reais para estudar Direito, por exemplo. Continuar lendo

O novo não se inventa, descobre-se

Reconhecido internacionalmente por suas contribuições às Ciências Humanas e, entre os que conviveram com ele, por sua generosidade e humildade, Milton Santos é hoje uma referência também para o movimento negro

Por Glauco Faria

“Ele representava nas Ciências Humanas o que se pode chamar de ala combatente. O que Florestan Fernandes foi na Sociologia, ele foi na Geografia. Nos seus trabalhos, o rigor científico nunca foi obstáculo a uma consciência social desenvolvida e profundamente arraigada nos problemas do Brasil.” Foi assim que um dos grandes intelectuais brasileiros, Antonio Candido, definiu o geógrafo Milton Santos, que foi seu colega na Universidade de São Paulo (USP).

Baiano de Brotas de Macaúbas, Milton Santos cursou Direito em Salvador, embora quando jovem tivesse dado aulas na área que verdadeiramente o apaixonava, a Geografia. Na universidade, envolveu-se com a política estudantil e chegou a ser eleito vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE). Mas as letras da lei não foram suficientes para seduzi-lo e, concluída a graduação, Milton tornou-se professor de Geografia do Instituto Central de Educação Isaías Alves (Iceia) e do Colégio Central. Levou a concurso sua tese Povoamento da Bahia, e passou a ocupar a cadeira de Geografia Humana do Ginásio Municipal de Ilhéus. E foi ali que escreveu seu primeiro livro, A Zona do Cacau, que tratava da monocultura na região. A obra já alertava para os riscos que poderiam advir da adoção de tal prática. Continuar lendo

Violência e controle social

Você liga a televisão e nos principais noticiários o que se vê é crime, caça a bandidos, violência. Há mesmo programas especialmente dedicados à cobertura de crimes e perseguições pela polícia. A cena flagrada pelas câmaras de segurança mais próximas repete à exaustão o momento em que o assaltante atira e mata sua vítima, que está indefesa. Continuar lendo

O Brasil entre o presente e o futuro

Lula contou com a bonança de um capitalismo sem crise e com um Estado fortalecido e uma economia organizada. Porém, o aumento da renda dos trabalhadores com pouca qualificação parece estar no limite, o mesmo ocorrendo com as elevações do salário mínimo sem incremento de produtividade e com a ampliação do crédito

por José Maurício Domingues

Em meados da década de 1980 começou o que se pode chamar de uma nova história do Brasil. Com a conclusão da “modernização conservadora” – baseada na aliança entre latifundiários e burguesia industrial –, o país se mostrava, à sua maneira, contemporâneo da modernidade que se afirmava planetariamente, ao mesmo tempo que uma verdadeira revolução democrática ocorria no país. Agora é o futuro que se põe como desafio, não a simples realização da modernidade.

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Universo das classes

Estudo publicado pelo Banco Mundial define a classe média como o grupo formado por aqueles que não correm mais o risco de retornar à pobreza

Alcides Leite

O Banco Mundial lançou recentemente a publicação Economic Mobility and the Rise of the Latin American Middle Class, dos autores Francisco H. G. Ferreira, Julian Messina, Jamele Rigolini, Luis-Felipe Lopez-Calva, Maria Ana Lugo e Renos Vakis.

Esta publicação, que, em tradução livre, se intitula Mobilidade Econômica e Crescimento da Classe Média Latino-Americana, mostra que, após décadas de estagnação, a classe média na América Latina cresceu a ponto de atingir o mesmo tamanho da classe dos pobres. Continuar lendo