A internet e o “orgasmo democrático”

A emergente participação em rede não produzirá novas ideologias unitárias ou revoluções, mas poderá destruir o velho jogo da governança representativa

Marcos Nunes Carreiro entrevista Massimo Di Felice

Muito se fala de como as redes sociais vêm modificando o pensamento social e ampliando a capacidade de reflexão, sobretudo dos jovens, em razão da participação fundamental da internet nas manifestações e protestos que tomaram o Brasil nos últimos meses. As mani­festações já viraram pauta nas escolas e com certeza serão conhecidas das próximas gerações. Mas, afinal, qual é o papel político-social das redes sociais e da internet?

Há quem diga que o momento atual do Brasil é de orgasmo democrático, ao ver milhares de pessoas saindo às ruas em razão da situação político-econômica do país. E é realmente instigante acompanhar a efervescência da sociedade, até para quem não tem ânimo de participar. Todavia, há discordância quanto ao termo “orgasmo democrático”. O professor da Faculdade de Comu­nicação da Universidade Federal de Goiás (UFG), Magno Medeiros, por exemplo, diz que orgasmo é um fenômeno fugaz e de satisfação imediata, ao contrário do que vive o Brasil atualmente. Continuar lendo

Para compreender o “Decrescimento”

Movimento não é saudosista, nem anticivilizatório. Mas sustenta: sem rever padrões de consumo e produção, “progresso” resultará em desigualdade e devastação

Por Alan Bocato-Franco

Pouco frequente, ainda, no Brasil, um debate tomou corpo e expandiu-se rapidamente nos últimos anos, em paralelo ao desconforto com o capitalismo e seus impasses. Trata-se da ideia de “decrescimento”. “Outras Palavras” abordou-o em diversos textos, no passado — mas deu-lhe destaque especial em 10 de outubro. Um artigo do cientista político catalão Vicenç Navarro criticava “algumas teorias” do decrescimento. Em sua opinião, elas acabam reduzindo-se a um ambientalismo elitista e antissocial, ao sugerirem, diante de países em crise, a continuação das políticas de “austeridade”, que geram mais desemprego e desindustrialização.

O artigo de Navarro gerou importante polêmica, na seção de comentários dos leitores. “Outras Palavras” convidou um dos polemistas, Alan Bocato-Franco, a escrever uma réplica. O resultado foi melhor que a encomenda. Muito mais que polemizar com Navarro — com quem, aliás, parece compartilhar pontos de vista –, Alan traça, no texto a seguir, um importante panorama sobre a origem, sentido e história das teorias do “decrescimento”. Continuar lendo

Hiperglobalização

Expansão das transnacionais, transportes facilitados e em especial novos acordos comerciais ameaçam desencadear outra rodada de ataques a direitos sociais

Por Christophe Ventura

Segundo a expressão dos economistas Arvind Subramanian e Martin Kessler, nossas sociedades entraram em uma era de “Hiperglobalização” [1]. Entre 1980 e 2011, o volume de mercadorias comercializadas na esfera planetária foi multiplicada por quatro, o nível do comércio mundial aumentou quase duas vezes mais rápido que a produção mundial de cada ano [2]. Segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), “o valor em dólares do comércio global de mercadorias aumentou mais de 7% por ano em média (…), atingindo um recorde de 18 bilhões de dólares ao final deste período.” De acordo com eles, “a troca de serviços comerciais aumentou ainda mais rápido, a uma taxa anual média de aproximadamente 8%, atingindo cerca de 4 bilhões de dólares” [3].

O comércio internacional, que representava 9% do PIB mundial em 1870, 16% em 1914, 5,5% em 1939 e cerca de 15% nos anos 1970, agora equivale a 33% [4].

Mesmo afetado pela crise financeira de 2008 e suas repercussões na redução do consumo, principalmente nos Estados Unidos, na China e na Europa – o volume do comércio global cresceu 2% em 2012 contra 5,1% em 2011 (2,5% são esperados para 2013). Esse montante com força inédita na integração comercial mundial, constitui, segundo os dois pesquisadores, a primeira característica da “Hiperglobalização”. Continuar lendo

Ruanda aposta em tecnologia para superar passado e transformar o país

Lerato Mbele

Projeto Um Laptop por Criança levou computadores a 400 escolas de Ruanda

Olive Uwineza, de 12 anos, sonha em se tornar presidente quando crescer. Ela estuda em uma sala de aula com outros 30 alunos, em uma escola primária de alta tecnologia e Kigali, Ruanda.

Cada estudante tem um laptop, que usa animações para tornar as aulas mais divertidas.

As matérias favoritas de Olive são matemática e ciências, e ela acha que seria “muito difícil fazer as lições” sem o computador.

Cinco anos atrás, o projeto Um Laptop por Criança (OLPC, na sigla em inglês) foi lançado na escola de Olive, com apoio do governo e de ONGs. Desde então, 200 mil computadores portáteis foram distribuídos em mais de 400 escolas do pequeno país do leste africano.

A infraestrutura da escola de Olive também melhorou – foi modernizada com conexão wi-fi e softwares adaptados ao currículo escolar.

O projeto é um dos pilares da iniciativa Visão de Ruanda para 2020, que tem a ambiciosa meta de transformar o país em um de economia baseada em tecnologia, semelhante ao papel desempenhado por Cingapura no leste asiático. Continuar lendo

Julius e Ethel‏ Rosenberg, os antecessores de Assange e Snowden

Braço siamês da política, imprensa tem papel fundamental para construção de verdades

Sou fascinado pelas ciências. Em seus domínios reina a dúvida, a interrogação. As verdades são sempre temporárias. Da folclórica maçã que deu origem a uma das leis de Newton à mecânica quântica, das especulações sobre a estrutura atômica à fissão nuclear, nada permaneceu intocado.Pulga na cueca. Lá, onde é necessária comprovação experimental para chancelar uma ideia, os mentirosos e charlatães não têm vida longa.

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Cientistas propõe Antropoceno como nova era geológica

Pesquisadores alegam que intervenção humana provoca mudanças irreversíveis no planeta. Marcas da civilização caracterizariam época antropocena, onde homem e natureza são indivisíveis: uma nova era de responsabilidade.

A escala de tempo geológico estabelece éons, eras, períodos, épocas e idades que permitem categorizar diferentes fases desde a formação do planeta. Há aproximadamente 11,7 mil anos, estudos focam a chamada época holocena. Mas a comunidade científica propõe uma revisão desse conceito: o novo período, chamado de Antropoceno, estabelece uma ligação intrínseca entre o ser humano e a natureza.

Em outros tempos, as paisagens eram determinadas por rios, vulcões, o movimento da Terra e mudanças climáticas naturais. Hoje, a interferência humana afeta diretamente esse processo. Tal visão implica uma mudança radical na ciência, pois não se pode mais conceber um processo evolutivo natural sem a interferência do homem e da tecnologia.

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Brasil é o 21º país que mais exporta armamentos

O Brasil subiu dez posições na lista dos países que mais exportaram armas convencionais (aviões de combate, tanques, veículos armados, helicópteros, artilharia, mísseis, entre outros) entre 2008 e 2012. No período, as exportações nacionais no setor aumentaram 167%, na comparação com o período de 2003-2007. Com isso, o País passou de 31º maior exportador, para 21º, segundo relatório do Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI), publicado na noite deste domingo 17, ao qual CartaCapital teve acesso com exclusividade no Brasil.

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Uma triste história de fogo e gelo

O naufrágio do Titanic – o senhor dos mares – e a explosão do Hindenburg – o rei dos céus – completam datas históricas em 2012 e lembram ao mundo como tragédias podem mudar a evolução da tecnologia.

O desastre parece estar na natureza dos Titanics: no mar, acabou nas geladas águas do Atlântico; no ar, explodiu em chamas. Os episódios mudaram a história do transporte mundial. (imagem: foto da Marinha dos Estados Unidos / gravura de Willy Stöwer, 1912)

O desastre parece estar na natureza dos Titanics: no mar, acabou nas geladas águas do Atlântico; no ar, explodiu em chamas. Os episódios mudaram a história do transporte mundial. (imagem: foto da Marinha dos Estados Unidos / gravura de Willy Stöwer, 1912)

Conforme o conhecimento do homem progride, o mundo parece tornar-se ‘menor’, em grande parte devido a novos e mais rápidos meios de transporte. O ano de 2012 é marcante para duas tragédias que ajudaram a redefinir os rumos dessa história: em 1912, Jack, Rose e mais 2.238 pessoas naufragavam com o Titanic nas águas geladas do Atlântico. Um quarto de século depois, em 6 de maio de 1937, as chamas consumiram o gigantesco zepelim alemão LZ 129 Hindenburg, o Titanic do céu, pouco antes de seu pouso, nos Estados Unidos. Continuar lendo

As biolutas e a constituição do comum > Giuseppe Cocco

Os moradores que defendem suas comunidades no RJ, os operários que se revoltam em Jirau e os ativistas dos Pontos de Cultura e dos pré-vestibulares afirmam em suas lutas as dimensões produtivas da vida. Nesse sentido, as biolutas são, produtivas e reivindicativas. Na luta contra a fragmentação, elas produzem o comum

Por Giuseppe Cocco

Crise. O mecanismo fundamental da atual crise do capitalismo global (aquela que começou em 2007 com o estouro da bolha imobiliária − subprime − nos Estados Unidos e agora se desdobra na crise da dívida soberana europeia e norte-americana) encontra-se na mobilização paradoxal do tempo de vida da população. Todo mundo trabalha o tempo todo, mas só se remunera o trabalho incluído na relação salarial. A expansão exponencial das finanças (do crédito espalmado em um sem-número de títulos derivados) permitiu governar esse descompasso: a população dos trabalhadores deve investir em sua “empregabilidade” (definida pelas várias formas de capital social, humano, intelectual etc.), ao passo que seu estatuto torna-se cada vez mais precário (a renda do salário diminui proporcionalmente ao lucro, o emprego é terceirizado, os serviços públicos são privatizados e a previdência, desmantelada). Esse novo tipo de trabalho vai ser controlado pelo dispositivo de um duplo endividamento: por um lado, moradia, saúde, educação, mobilidade, conexão e conectividade passam a ser pagos por meio do acesso ao crédito; por outro, a remuneração do trabalho toma a forma de um “prêmio” por objetivos alcançados que liga (endivida) a subjetividade do trabalhador ao projeto da empresa − a dívida monetária desdobra-se naquela subjetiva (e vice-versa) e as duas tornam-se impagáveis: crise! Ninguém é capaz de prever a duração desta crise e ainda menos de dizer como se construirá uma capacidade política, além de econômica, de gerenciar a multiplicação cumulativa das contradições sociais. Mas as lutas às quais estamos assistindo (desde as revoluções da África do Norte e do Oriente Médio até as manifestações de Wisconsin, nos Estados Unidos, passando pelos recentes tumultos de Londres, Roma e chegando à revolta de 20 mil operários da barragem de Jirau, no Brasil) indicam a urgência dos esforços de apreender o que são hoje a acumulação, o trabalho e a exploração. Continuar lendo

O decrescimento e os limites da Terra

José Eustáquio Diniz Alves*

“As atividades humanas estão atingindo o limite imposto pelo Planeta, dado a tecnologia corrente.” Esta frase já foi escrita e reescrita ao longo da história. Ela traz duas tendências conflitantes: por um lado os limites da Terra tendem a interromper o crescimento econômico, mas novas tecnologia tendem a expandir os limites da presença do ser humano no Planeta. Continuar lendo