Löwy: Dez teses sobre a ascensão da extrema direita europeia

Por Michael Löwy

A ascensão do neonazismo na Europa e nos EUA tem sido relegada a um segundo plano pelas forças progressistas

O resultado das eleições para o Parlamento Europeu, no fim de maio, registrou na prática o fortalecimento dos partidos de extrema direita no continente. Para o sociólogo Michael Löwy, em artigo traduzido pela jornalista Úrsula Passos, o discurso com que esquerda explica o crescimento do fascismo pela via da crise econômica reduz fenômeno e deixa de lado suas raízes históricas.

Leia, a seguir, a íntegra do artigo: Continuar lendo

Vigiar, punir e exibir!

Novos casos de linchamento relembram: transformar violência em espetáculo é uma forma de mascarar a brutalidade oculta que permeia sociedade

Por Celso Vicenzi | Imagem: Katerina Apostolakou

As pessoas que amarram seres humanos em postes ou os imobilizam com travas de bicicleta – cenas que se repetem de diferentes maneiras pelo Brasil, assim como os linchamentos – têm as mesmas motivações daqueles que pregaram Cristo na cruz. Não há diferenças, por mais cristãos que os contemporâneos imaginem ser. Salvo a distância no tempo, são atos com um mesmo propósito, o de exibir a punição para servir de exemplo.

São os mesmos que queimaram entre 100 mil e 500 mil mulheres nas fogueiras da Inquisição Católica, na Europa, acusadas de bruxaria (há quem fale em 9 milhões).

Não diferem dos que enforcaram Tiradentes, o esquartejaram e penduraram sua cabeça em Vila Rica e pedaços de seu corpo nos lugares em que fizera seus discursos revolucionários.

Para que os exemplos não frutifiquem, é preciso sempre uma dura lição! Continuar lendo

Negros no Brasil

Resistência sempre foi a palavra de ordem de quem era forçado ao trabalho escravo. Os negros foram caçados, perseguidos e, ainda hoje, são, muitas vezes, hostilizados, conforme revela pesquisa do Ipea

Maurício Barroso

Desde que os colonizadores portugueses chegaram ao Brasil, há mais de quinhentos anos, eles exploraram, inicialmente, a mão de obra indígena. Entretanto, o contato com os homens brancos foi péssimo para a saúde dos índios. Além disso, os nativos conheciam muito bem o território e fugiam com facilidade.

Por razões econômicas e também em busca de mão de obra qualificada, os portugueses começaram a trazer africanos escravizados para o Brasil. Os negros eram obrigados a vir para um país estranho, numa travessia de barco que levava meses, em condições precárias, para trabalhar forçadamente. Continuar lendo

Não penso, logo relincho

Um glossário com a lista dos principais clichês repetidos pelas redes sociais para justificar, no discurso, um mundo de violência e exclusão. Por Matheus Pichonelli

Dizem que uma mentira repetida à exaustão se transforma em verdade. Pura mentira. Uma mentira repetida à exaustão é só uma mentira, que descamba para o clichê, que descamba para o discurso. E o discurso, quando mal calibrado, é o terreno para legitimar ofensas, preconceitos, perseguições e exclusões ao longo da História. Nem sempre é resultado da má-fé. Por estranho que pareça, é na maioria das vezes fruto da indigência mental – uma indigência mental que assola as escolas, a imprensa, as tribunas, as mesas de bares, as redes sociais. Com os anos, a liberdade dos leitores para se manifestar sobre qualquer assunto e o exercício de moderação de comentários nos levam a reconhecer um clichê pelo cheiro. Listamos alguns deles abaixo com um apelo humanitário: ao replicar, você não está sendo original; está apenas repetindo uma fórmula pronta sem precisar pensar sobre tema algum. E um clichê repetido à exaustão, vale lembrar, não é debate. É apenas relincho*. Continuar lendo

De nazismo a fascismo

A extrema-direita cresce em vários países, a começar pelo Aurora Dourada na Grécia. Hoje o FN de Marine Le Pen é o maior partido da França

Apoiadores do partido Aurora Dourada protestam em Atenas contra a acusação a membros do partido de crime organizado, em 2 de outubro

Nikos Michaloliakos, o líder do partido grego Aurora Dourada, aguarda julgamento atrás das grades. Se provados elos diretos do deputado extremista com a morte do músico Pavlos Fyssas a 18 de setembro em Atenas, o sombrio matemático de 56 anos e mais uma caterva de colegas passarão anos atrás das grades.

Enquanto isso, na quinta-feira 10 a capa do semanário francês Le Nouvel Observateur estampou a foto de Marine Le Pen, líder da legenda de extrema-direita Frente Nacional (FN), com outra espantosa notícia: segundo uma sondagem do Ifop para o semanário, 24% dos franceses votarão na FN nas eleições europeias, em maio de 2014. Portanto, a FN terá mais votos do que as duas maiores legendas francesas, o Partido Socialista e a conservadora União por um Movimento Popular (UMP). Marine Le Pen poderá se tornar a líder do maior partido da França. Nesse caso seria previsível uma nova eleição presidencial semelhante àquela de 21 de abril de 2002, quando o pai de Le Pen, Jean-Marie, disputou o segundo turno contra o conservador Jacques Chirac. Detalhe: Marine Le Pen terá mais chances de levar a melhor nas próximas presidenciais.

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Xenofobia em nome do Estado de bem-estar social

Uma vez que as finanças públicas vão mal, é preciso resguardar o sistema de proteção social rastreando os fraudadores, mas também os estrangeiros. Esse raciocínio, martelado por diversos dirigentes políticos europeus, ganha cada vez mais legitimidade

por Alexis Spire

Enquanto as soluções para tirar a União Europeia da crise econômica despertam ásperos debates, há um assunto que é consenso entre os líderes políticos do Velho Continente: a luta contra aqueles que estariam abusando dos sistemas de proteção social. Os imigrantes da África e do Magrebe, e mais recentemente os ciganos, são o foco principal dessa nova cruzada contra os “assistidos”. Em uma carta de 23 de abril de 2013, os ministros do Interior alemão, inglês, austríaco e holandês apresentaram queixa à Presidência da Irlanda denunciando “fraudes e abusos sistemáticos do direito à livre circulação proveniente dos outros países da União Europeia”. Teríamos passado de uma imigração econômica para um turismo de benefícios sociais. Continuar lendo

Nosso racismo é um crime perfeito

O antropólogo Kabengele Munanga fala sobre o mito da democracia racial brasileira, a polêmica com Demétrio Magnoli e o papel da mídia e da educação no combate ao preconceito no país

Por Camila Souza Ramos e Glauco Faria

Fórum – O senhor veio do antigo Zaire que, apesar de ter alguns pontos de contato com a cultura brasileira e a cultura do Congo, é um país bem diferente. O senhor sentiu, quando veio pra cá, a questão racial? Como foi essa mudança para o senhor?

Kabengele – Essas coisas não são tão abertas como a gente pensa. Cheguei aqui em 1975, diretamente para a USP, para fazer doutorado. Não se depara com o preconceito à primeira vista, logo que sai do aeroporto. Essas coisas vêm pouco a pouco, quando se começa a descobrir que você entra em alguns lugares e percebe que é único, que te olham e já sabem que não é daqui, que não é como “nossos negros”, é diferente. Poderia dizer que esse estranhamento é por ser estrangeiro, mas essa comparação na verdade é feita em relação aos negros da terra, que não entram em alguns lugares ou não entram de cabeça erguida.

Depois, com o tempo, na academia, fiz disciplinas em antropologia e alguns de meus professores eram especialistas na questão racial. Foi através da academia, da literatura, que comecei a descobrir que havia problemas no país. Uma das primeiras aulas que fiz foi em 1975, 1976, já era uma disciplina sobre a questão racial com meu orientador João Batista Borges Pereira. Depois, com o tempo, você vai entrar em algum lugar em que está sozinho e se pergunta: onde estão os outros? As pessoas olhavam mesmo, inclusive olhavam mais quando eu entrava com minha mulher e meus filhos. Porque é uma família inter-racial: a mulher branca, o homem negro, um filho negro e um filho mestiço. Em todos os lugares em que a gente entrava, era motivo de curiosidade. O pessoal tentava ser discreto, mas nem sempre escondia. Entrávamos em lugares onde geralmente os negros não entram. Continuar lendo

O genocídio dissimulado

As evidências de que o Brasil é dividido por uma espécie de racismo institucional, no qual o próprio Estado, por seus agentes, atua de forma discricionária com base na cor da pele, aparecem em quase todos os indicadores

Por Luciano Martins Costa

Pequena nota escondida no meio de uma coluna do Estado de S.Paulo e uma reportagem mais extensa no Globo mostraram, na sexta-feira (18/10), como a imprensa brasileira, tão homogênea ao lidar com a política e a economia, pode divergir e até ser negligente ao tratar de assuntos mais complexos.

Os dois textos se referem a um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre racismo no Brasil. Basta citar uma das conclusões do trabalho para ilustrar como esse tema deveria merecer muito mais destaque nos jornais: por causa da violência seletiva, a expectativa de vida de um homem jovem brasileiro, negro ou pardo, é menos que a metade da de um homem branco da mesma idade. Continuar lendo

Os náufragos africanos e o naufrágio moral da Europa

Eduardo Febbro

Paris – As máscaras do bem caem como maquiagem escorrida pela chuva. Atrás delas aparece o horripilante rosto de uma verdade oculta no papel presente de uma larga cultura declamatória. A União Europeia semeia seus valores com a palavra, mas os nega com os fatos. A realidade não resiste muito: segundo cifras da ONU, 1.500 pessoas morrem por ano no Mediterrâneo, em sua maioria nas costas do Norte da África. Cerca de 20 mil morreram tragadas pelo mar nas últimas duas décadas, cerca de 400 nos últimos 15 dias.

Há uma semana, os ministros do Interior da União Europeia foram incapazes de oferecer tanto uma estratégia como uma resposta humana comum ao drama cotidiano das milhares de pessoas que se lançam ao mar em barcos improvisados com destino às costas de Malta ou da Itália. Inação, racismo galopante, terror à palavra “imigração”, desacordos entre os Estados que compõem a União Europeia, miséria dos países africanos de onde fogem os imigrantes em busca de um destino melhor: tudo concorre para fazer do Mediterrâneo o que o presidente de Malta, Joseph Muscat, chamou de “cemitério”.

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O preço do progresso e os dois Brasis

Manifestantes interrompem obra, em protesto contra a usina de Belo Monte

Protestos foram enorme surpresa internacional. Para entendê-los, deve-se examinar as agendas interrompidas no governo Dilma – e a que se impôs

Por Boaventura de Sousa Santos

Com a eleição da Presidente Dilma Roussef, o Brasil quis acelerar o passo para se tornar uma potência global. Muitas das iniciativas nesse sentido vinham de trás mas tiveram um novo impulso: Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente, Rio +20, em 2012, Campeonato do Mundo de Futebol em 2014, Jogos Olímpicos em 2016, luta por lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU, papel ativo no crescente protagonismo das “economias emergentes”, os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) Continuar lendo