O rolezinho da juventude nas ruas do consumo e do protesto

Os “rolezinhos” levaram para dentro do paraíso do consumo a afirmação daquilo que esse mesmo espaço lhes nega: sua identidade periférica. Se quando o jovem vai ao shopping namorar ou consumir com alguns amigos ele deve fingir algo que não é, com os rolezinhos ele afirma aquilo que é!

por Renato Souza de Almeida

Os jovens têm criado formas cada vez mais interessantes de manifestação. Desde as jornadas de junho de 2013 – que levou às ruas milhares de brasileiros – até os chamados “rolezinhos” – que também vêm colocando centenas em circulação – se instalou uma crise na análise daqueles que insistiam em afirmar uma possível apatia dessa geração juvenil.

“Sair de rolê…” significa dar uma circulada despretensiosa pela vila ou pela cidade. É possível dar um rolê de trem, de ônibus ou a pé. Geralmente, o rolê está ligado ao lazer ou a alguma prática cultural. Sai de rolê o pichador, o skatista, o caminhante… O que vem chamando a atenção de muita gente é como um simples gesto de sair e circular de forma livre tem ocupado um papel central nas principais mobilizações juvenis na cidade de São Paulo nos últimos tempos. Continuar lendo

A história do ódio no Brasil

Se tivesse nascido no Brasil, Gandhi não seria um homem sábio, mas um “bundão” ou um “otário”

Por Fred Di Giacomo

As decapitações que chocam nos presídios eram moda há séculos e foram aplicadas em praça pública para servir de exemplo nos casos de Tiradentes e Zumbi

“Achamos que somos um bando de gente pacífica cercados por pessoas violentas”. A frase que bem define o brasileiro e o ódio no qual estamos imersos é do historiador Leandro Karnal. A ideia de que nós, nossas famílias ou nossa cidade são um poço de civilidade em meio a um país bárbaro é comum no Brasil. O “mito do homem cordial”, costumeiramente mal interpretado, acabou virando o mito do “cidadão de bem amável e simpático”. Pena que isso seja uma mentira. “O homem cordial não pressupõe bondade, mas somente o predomínio dos comportamentos de aparência afetiva”, explica o sociólogo Antônio Cândido. O brasileiro se obriga a ser simpático com os colegas de trabalho, a receber bem a visita indesejada e a oferecer o pedaço do chocolate para o estranho no ônibus. Depois fala mal de todos pelas costas, muito educadamente. Continuar lendo

Polícia: para quê polícia?

Por que respostas da PM e governos, diante das manifestações e “black-blocs”, sugerem desejo de fechamento autoritário

Por Tânia Caliari,

Desde que começaram as manifestações de junho, um elemento perturbador insinuou-se no cenário brasileiro: o comportamento errático das PMs – especialmente as de São Paulo e Rio de Janeiro. As tropas, comandadas pelos governos estaduais e conhecidas por seu vínculo militar e truculência nas periferias, alternaram atitudes opostas, e aparentemente descoordenadas. Na maior parte do tempo, agiram com violência, que repetidas vezes chegou a níveis de selvageria. Porém, em diversas ocasiões, ausentaram-se por completo – assistindo impassíveis a atos como a tentativa de incendiar a Câmara Municipal do Rio, em 7 de outubro. Em algumas poucas oportunidades, a PM cumpriu seu papel e assegurou o direito constitucional de manifestação. Em outras, policiais disfarçados de manifestantes foram filmados atirando coquetéis molotov contra prédios públicos.

Que está por trás deste estranho conjunto de atitudes? Durante um mês, a reporter Tânia Caliari foi em busca de respostas. Encontrou-se com os “black-blocs”, no vão do MASP e nas escadarias da Câmara do Rio. Entrevistou autoridades policiais. Dialogou com pesquisadores e organizações de defesa dos direitos humanos. Ao final, produziu vasta reportagem, publicada na edição de outubro da revista “Retrato do Brasil

Tânia apurou e escreveu em agosto e setembro, quando o elemento principal das manifestações era o chamado “bloco negro” (a greve dos professores do Rio, por exemplo, não havia começado). Mas, ao invés de levar em conta apenas os confrontos entre a polícia e este grupo, a repórter procurou entender também seu contexto. Ao fazê-lo, chegou a observações mais profundas. Continuar lendo

A revolta do gás lacrimogêneo (em sete capítulos)

As semanas que mudariam a história da política brasileira começaram com um protesto desinteressante. Os outros atos se sucederam com novidades: jovens dispostos a resistir à PM, arregimentados em redes sociais, lidando com o despreparo das autoridades

1º PROTESTO (quinta-feira, dia 6): Eram só cerca de 150 meninos do Movimento Passe Livre (MPL) e estudantes ligados ao PSOL e PSTU em frente à Prefeitura. Eles já haviam feito manifestações semelhantes em outros anos. Sem novidades.

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