“O maior legado da Copa foi a especulação imobiliária”

O coordenador nacional do MTST, Guilherme Boulos, expõe as razões que levaram o movimento a tornar-se um dos protagonistas dos protestos contra o Mundial.

Guilherme Boulos (esq.) encontrou com Dilma, antes de inauguração do Itaquerão, para discutir desapropriação de terreno no entorno do estádio

Desde o início das obras da Arena Corinthians, há três anos, os apartamentos no bairro de Itaquera, na zona leste de São Paulo, apresentaram uma valorização de 50%, segundo o índice Finpe/Zap. Entre 2008 e 2011, o aumento dos preços não passou de 10%. Não há como negar a relação entre o advento da estrutura para a Copa do Mundo na região e a disparada da especulação imobiliária. Nesse cenário, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) tem assumido um protagonismo maior nos protestos contra o megaevento. Em 2 de junho, o grupo liderou a ocupação de um terreno em frente ao Parque do Carmo, em Itaquera, a quatro quilômetros do palco de abertura do Mundial. Mais de 2 mil famílias montaram barracões na chamada “Copa do Povo”. Na quinta-feira 8, o coletivo Resistência Urbana, capitaneado pelo MTST, organizou três frentes de protestos em São Paulo. Os alvos foram as sedes das construtoras OAS, Odebrecht e Andrade Gutierrez, responsáveis por erguer mais de metade das arenas para a Copa.

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Copa no Brasil deixará ônus, e não legado, diz relatora da ONU

Para a urbanista Raquel Rolnik, o legado urbanístico que a Copa do Mundo vai deixar para o País não será significativo

Relatora especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU para o Direito à Moradia Adequada acredita que Copa não deixará legado significativo

Tidos pelo poder público como uma vitrine para o País e uma oportunidade de investimentos, os grandes eventos que serão realizados no Brasil acabaram servindo de estopim para uma série de reivindicações, que eclodiram nas agora conhecidas como jornadas de junho. Essas reivindicações seguem se desdobrando, causando dor de cabeça aos governantes e perplexidade aos estudiosos. No centro da questão, por sediar a final da Copa do Mundo e as Olimpíadas e fazer parte do imaginário estrangeiro do Brasil, a cidade do Rio de Janeiro e os seus 6 milhões de habitantes servem de laboratório, e se veem entre as promessas de uma cidade melhor e a realidade caótica de má qualidade dos serviços públicos e obras aquém do anunciado.

Para a urbanista Raquel Rolnik, professora da Universidade de São Paulo e relatora especial do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Direito à Moradia Adequada, que acompanha de perto o processo desde 2009, a principal discussão que se coloca é o direito à cidade e a necessidade de se investir em uma cidade realmente para todos. “Não é comprar casa, comprar moto. Tem uma dimensão publica essencial que é a urbanidade e que precisa ser resolvida”, afirma. Continuar lendo

“Na Amazônia, o que ocorreu e continua ocorrendo é um processo de colonização”

“Os responsáveis pelos lotes são originários de vários estados do Brasil. No entanto, foi do estado do Paraná que a maior parte dessas pessoas veio, fazendo da região Sul do país a de maior migração para o assentamento [de Matupi]”, afirma a pesquisadora

Por Luciano Gallas

Do IHU-Online

“É preciso entender o papel da política agrária que acontece no nosso país, pois na Amazônia o que ocorreu e continua ocorrendo é um processo de colonização, por meio de uma reforma agrária conservadora e como forma de desviar a reforma agrária do centro-sul do país, onde realmente existe demanda por esta questão”, afirma a bióloga Viviane Vidal da Silva. Ela obteve doutorado em Ciências Biológicas, área de concentração em Ecologia Aplicada, com pesquisa sobre o impacto das atividades produtivas do assentamento agrário de Matupi, estado do Amazonas, na paisagem natural daquela região.

De acordo com a pesquisa realizada pela bióloga, o assentamento é o principal responsável pelo desmatamento na região, já que os lotes não observariam os limites impostos pela legislação no que se refere às áreas de preservação florestal em função da substituição da atividade agrícola pela pecuária. Continuar lendo

ESPECIAL DAVID HARVEY – 3 entrevistas realizadas com o geógrafo em sua última passagem pelo Brasil

O marxista que quer reinventar as cidades (I)

David Harvey provoca, em longa entrevista: é hora de adaptar ambiente urbano ao tipo de gente que queremos ser

Entrevista a Vince Emanuele | Tradução: Sônia Scala Padalino

Se vivemos em cidades que nos infernizam e aprisionam, qual a causa de sua desumanidade? E, mais importante: que caminhos permitirão transformá-las? As respostas, para esta questão crucial, raramente coincidem. Às vezes, são genéricas demais e paralisam: núcleos urbanos insuportáveis seriam consequência necessária de um sistema que coloca o lucro acima dos seres humanos. Só o fim do capitalismo abriria espaço para novas cidades. Em outros casos, as respostas são muito pouco ambiciosas. Diante de adversários poderosíssimos – o poder econômico e uma política institucional cada vez mais impermeável às aspirações sociais – deveríamos nos concentrar em humanizar espaços restritos. Uma bairro, uma praça, uma horta comunitária.

Acaba de percorrer três cidades brasileiras – Rio, Florianópolis e São Paulo – David Harvey, um pensador que busca, há décadas, soluções para este impasse. Geógrafo, Harvey é também marxista. Para ele, portanto, o degradação das cidades está associada ao capitalismo. Continuar lendo

Cidade dos extremos

Para historiador, os verdadeiros donos do espaço urbano são a elite e a favela: uma, pela economia; outra, pela ocupação

Juliana Sayuri – O Estado de S. Paulo

Retrato novo de mazelas antigas: dia 6 de novembro saiu o estudo Aglomerados Subnormais – Informações Territoriais, do IBGE, mostrando que 11.425.644 brasileiros vivem em construções alheias às regras do planejamento urbano. Além de aterros, mocambos, loteamentos irregulares e outros rincões improvisados e informais, há 6.329 favelas, onde se empoleiram 3.224.529 casas, principalmente no eixo Rio-SP. Nesse país favela, onde champanhe é “statis” para uns e outros, as cidades retratam o abismo social do Brasil.

Nireu Cavalcanti é arquiteto, urbanista e historiador e professor da UFF

Outras questões essencialmente urbanas voltaram à pauta paulistana nos últimos dias. Hussain Aref Saab, ex-diretor do Aprov que adquiriu 106 imóveis entre 2005 e 2012, tornou-se alvo de ação de improbidade administrativa. Ronilson Rodrigues, chefe da máfia do ISS, disse que o ex-prefeito Gilberto Kassab sabia do esquema que pode ter custado R$ 500 milhões aos cofres da cidade. Marcos Costa, presidente da Alstom, passou mal e escapou da CPI em que seria ouvido sobre a formação de cartel nos trilhos de Geraldo Alckmin. “As cidades brasileiras estão sendo administradas de uma forma profundamente desvirtuada do interesse público. Isso não é restrito a São Paulo. E não é ‘privilégio’ de um ou outro partido”, critica o urbanista Nireu Cavalcanti, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). Continuar lendo

Espaço urbano: uma trajetória histórica

Para entendermos a atual dinâmica do espaço urbano, devemos vislumbrar quais processos dão origem a sua complexidade organizacional, sua forma, seu conteúdo e produção.

por Guilherme Freitas Hartmut Behm*

Como diria Lewis Mumford no estudo da história das cidades em seu livro A Cidade na História: “Se quisermos identificar a cidade, devemos seguir a trilha para trás, partindo das mais completas estruturas e funções urbanas conhecidas, para seus componentes originários, por mais remotos que se apresentem.”

Avenida Paulista em 4 tempos: 1. A Pintura de Jules Martin mostra a Avenida Paulista na época de sua inauguração. A Paulitsta foi inaugurada por Joaquim Eugênio de Lima no dia 8 de Dezembro de 1891. Fonte: Acervo do Museu Paulista da Universidadede São Paulo (reprodução do livro Álbum Iconográfico da Avenida Paulista de Benedito Lima de Toledo). 2. Foto de 1935 mostra a vista aérea da Avenida Paulista do trecho que vai da Rua Minas Gerais a Rua Augusta. Do lado direito, a grande construção é o Colégio São Luiz e ao fundo o bairro do Pacaembu. 3. Durante as décadas de 60 e 70, com a valorização imobiliária da região, começam a surgir na Avenida Paulista os característicos “espigões”, edifícios de escritórios com 30 andares em média. 4. Durante sua evolução, a Avenida Paulista passou por várias reformas paisagísticas. Os locais destinados aos carros foram alargados e criaram-se calçadões com desenhos de mosaicos portugueses em branco e preto.

O mundo nem sempre foi como hoje, urbano. No passado, antes da produção do excedente  , no período Paleolítico, os homens eram nômades, não tinham moradia fixa. Contudo, foi justamente nesse período que apareceram as primeiras manifestações e o interesse de se fixar  em algum lugar. Continuar lendo

Cidades em crise

Os interesses do capital imobiliário e a omissão do Poder Público fazem com que o planejamento urbano seja relegado a um segundo plano, enquanto o direito à moradia é negado a uma boa parte da população

Por Adriana Delorenzo, Gisele Brito e Glauco Faria

“Ninguém esperava que o local onde foi fundado o Jardim Edith, antes do início dos anos 1970, seria, um dia, uma das áreas mais disputadas da cidade.” A reflexão é de Gerôncio Henrique Neto, 69 anos, líder comunitário de uma favela que foi demolida por conta da Operação Urbana Água Espraiada, na zona Sul de São Paulo. As casas modestas, na maioria de alvenaria, ficavam em uma das áreas que, no início da ocupação, em 1973, estava longe de ser o que hoje é uma das áreas mais valorizadas da capital paulista. Continuar lendo

Após obras de Belo Monte, Altamira enfrenta insegurança e alta de preços

Terra Indígena do povo Arara da Volta Grande do Xingu, que vive na "área de influência" de Belo Monte.

Terra Indígena do povo Arara da Volta Grande do Xingu, que vive na "área de influência" de Belo Monte.

Lunaé Parracho
Especial de Altamira (PA)

 

Em 3 de Janeiro, foi publicada do Diário Oficial, pela ANEEL, a última desapropriação de terras para a construção de Belo Monte, uma declaração de utilidade pública para uma área 282,3 mil hectares no Pará. A declaração foi solicitada pela Norte Energia, empresa responsável pelo empreendimento, que na prática ficou autorizada a remover e “reassentar” ribeirinhos, índios e moradores de Altamira. Este é considerado um dos pontos mais polêmicos no projeto da usina, com o cadastro de famílias instaladas em áreas de interesse dos empreendedores sendo feito sem o devido esclarecimento da população local. Continuar lendo

A Metrópole Global: Economia da Dívida e o Leviatã Imobiliário

Favela da Rocinha no Rio

Favela da Rocinha no Rio

As metrópoles brasileiras testemunham a maior escassez de imóveis para alugar em dez anos, o que ajuda a entender o violento aumento de seu preço nos últimos tempos. Evidentemente, a crise imobiliária não se restringe ao Brasil, embora aqui, por óbvias circunstâncias históricas, estejamos às portas de uma situação limite: os milhões de brasileiros que vivem nas ruas ou em áreas irregulares são aquelas pessoas que foram, simplesmente, deixadas para morrer ao relento, mas que de alguma forma lutam nessa circunstância ou no locus definitivo de resistência urbana, a Favela. Continuar lendo