Três anos de revoltas conectadas

Novos estudos tentam compreender ações de protesto que marcam cenário mundial. Que têm em comum? Como evoluem? Para onde caminham?

Por Bernardo Gutierrez | Tradução: Cauê Ameni e Gabriela Leite

Existem elementos comuns entre a explosão do movimento espanhol 15M e o nascimento #YoSoy123 no México? Pode-se traçar algum paralelo entre a defesa do Gezi Park, em Istambul, e as revoltas iniciadas pelo Passe Livre no Brasil? Há padrões compartilhados entre as revoltas que sacudiram o mundo desde a centelha da Primavera Árabe?

Se levarmos em conta apenas pautas concretas, as revoltas poderiam parecer desconexas. O grito de “Não somos mercadorias nas mãos dos políticos e banqueiros”, do 15M, teria pouco a ver com o “Se a tarifa não baixar, a cidade vai parar”, das revoltas no Brasil. Occupy Wall Street estaria longe do #YoSoy132 mexicano, que nasceu contra a criminalização de 131 estudantes da Universidade Iberoamericana. No entanto, o imaginário de todas as revoltas parece conectado por algo que escapa à lógica. Continuar lendo

“Zapatismo foi um movimento indígena com características ocidentais”

Para o geógrafo britânico David Harvey, a experiência em Chiapas foi influente. Mas a esquerda deve pensar em outras formas de se organizar na cidade

Zapatistas no México em 1999

Pesquisador de revoltas recentes ao redor do mundo, o geógrafo britânico David Harvey reconhece a influência dos zapatistas nos novos levantes que têm surgido. Mas ele pondera que algumas das suas características são ignoradas pela esquerda em diversos países.

O geógrafo concedeu uma entrevista à reportagem de CartaCapital, na qual fala sobre o legado do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), que há vinte anos tomou o controle de parte da pobre província mexicana de Chiapas.

Harvey destaca as novidades trazidas pelo levante, como a ênfase no direito das mulheres. Ele, porém, se diz “cansado” das pessoas acharem que a revolução “sairá de Chiapas”. Para o geógrafo, a esquerda deve achar uma forma própria de se organizar na cidade. Leia abaixo as falas do geógrafo sobre o levante:

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ESPECIAL DAVID HARVEY – 3 entrevistas realizadas com o geógrafo em sua última passagem pelo Brasil

O marxista que quer reinventar as cidades (I)

David Harvey provoca, em longa entrevista: é hora de adaptar ambiente urbano ao tipo de gente que queremos ser

Entrevista a Vince Emanuele | Tradução: Sônia Scala Padalino

Se vivemos em cidades que nos infernizam e aprisionam, qual a causa de sua desumanidade? E, mais importante: que caminhos permitirão transformá-las? As respostas, para esta questão crucial, raramente coincidem. Às vezes, são genéricas demais e paralisam: núcleos urbanos insuportáveis seriam consequência necessária de um sistema que coloca o lucro acima dos seres humanos. Só o fim do capitalismo abriria espaço para novas cidades. Em outros casos, as respostas são muito pouco ambiciosas. Diante de adversários poderosíssimos – o poder econômico e uma política institucional cada vez mais impermeável às aspirações sociais – deveríamos nos concentrar em humanizar espaços restritos. Uma bairro, uma praça, uma horta comunitária.

Acaba de percorrer três cidades brasileiras – Rio, Florianópolis e São Paulo – David Harvey, um pensador que busca, há décadas, soluções para este impasse. Geógrafo, Harvey é também marxista. Para ele, portanto, o degradação das cidades está associada ao capitalismo. Continuar lendo

O quê as revoltas de 2013 têm em comum

Milhares de estudantes protestam em Lima, no Peru, marchando em direção ao prédio do Congresso Nacional contra um projeto de lei que, segundo eles, viola a autonomia universitária

Na Turquia, Brasil, Bulgária e Peru o que se assemelha não é ideologia – mas arquitetura de convocação das multidões

Por Bernardo Gutiérrez,

Como o acampamento no parque Taksim de Istambul influenciou os protestos no Brasil? O surgimento repentino de os Indignados do Peru se explica como contágio regional? Existe algum ponto em comum nos protestos dos três países anteriores e as manifestações na Bulgária contra seu governo? Os analistas costumam buscar motivos concretos para explicar as revoltas dos últimos tempos. E transformam o diagnóstico inicial em tese irrefutável. Istambul se levantou para proteger o parque Taksim da mercantilização neoliberal. As urbes brasileiras se levantaram contra o aumento do preço do transporte. Os peruanos se indignaram frente a um governo que tentou distribuir cargos públicos de forma pouco transparente. Os búlgaros cercam o congresso durante semanas para protestar contra o aumento exagerado das faturas de água e gás e o conluio da classe política com grupos mafiosos. Mas ditas causas explicam as intensos protestos dos últimos meses? Continuar lendo

A Primavera do Direito à Cidade

Revolta dos jovens turcos foi resposta à privatização de Istambul. Levante revela emergência das lutas pelo Comum urbano e ambiental

Por Bernardo Gutierrez | Tradução: Bruna Bernacchio | Imagens: Jamie Bowlby-Whiting

Taksim é nosso, Istambul é nossa!”. Os gritos não pertencem a algum dos jovens que ocuparam o Parque Taksim Gezi, da capital turca, na virada do mês. Tampouco é um mote que esteja correndo o mundo no Twitter, sob a tag #OccupyGezi. “Taksim é nosso” está sendo pronunciado por um cidadão anônimo no vídeo Tkasim Square (Istambul Commons), durante uma manifestação celebrada no outono passado. “Taksim é nosso” – continua a voz no megafone – “não importa as opções políticas que tenham as pessoas”.

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A hora do Direito à Cidade

20/06: preparativos para a manifestação em São Paulo

Para que a vitória que comemoramos se amplie (e não seja capturada pela direita) é preciso dar-lhe sentido mais profundo

Por Alexandre Pilati*

Well, everyone can master a grief but he that has it
William Shakespeare

Contrariando todas as expectativas, as manifestações que começaram há duas semanas em São Paulo, com uma pauta de reivindicações bastante restrita, ampliaram-se. Os protestos estenderam-se pelo Brasil inteiro em ruas, praças e arredores de estádios de futebol que recebem a Copa das Confederações. Continuar lendo

Manifestações no Brasil e a lógica do capitalismo hoje

O recurso à violência e a luta pelo real significado da palavra “democracia” parecem despontar como algumas das questões que envolvem os protestos pelo país

No sentido de uma crise generalizada do contexto sócio-econômico nacional e mundial, podemos afirmar que as manifestações iniciadas contra o aumento das passagens de ônibus, em diversas cidades do Brasil, são “políticas”. No entanto, parece não ser este o sentido outorgado a elas, ao menos pelos gestores estaduais. Alarmados com a força demonstrada pela articulação popular (iniciada pelo Movimento Passe Livre), os governadores de São Paulo e do Rio de Janeiro, Geraldo Alckmin (PSDB) e Sérgio Cabral (PMDB), apressaram-se em tachar os protestos, na última quinta-feira, de “políticos”: querendo significar, entretanto, que se tratam na verdade de estratégias partidárias e não de “mobilizações espontâneas”.

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Ocupar cidades é uma forma de luta muito poderosa, diz o geógrafo David Harvey

Britânico convida esquerda a usar centros urbanos para confrontar o capitalismo

As cidades são uma força econômica muito poderosa. Fechar as cidades, também. Para o geógrafo marxista David Harvey, a esquerda deve aprender a usar isso como forma de luta. O pensamento é também um apelo do britânico, e acompanha sua linha de análise sobre o papel da urbanização como intervenção no sistema econômico.

“Tudo parou de se mexer por três dias em Nova York depois do 11 de setembro. E de repente os poderes perceberam que se não houvesse movimento, não haveria acumulação de capital. O prefeito foi então à televisão fazer um apelo para que as pessoas fossem às ruas consumir, viver normalmente.” O ativista anti-capitalismo cita ainda as mobilizações que aconteceram na Praça Tahrir, no Egito, e o movimento Occupy, espalhado pelo mundo, como exemplos de engajamento urbano. Em visita ao Brasil, insistiu, para um público de mais de mil pessoas, que os centros urbanos são o lugar em que alguma forma de luta contra o capitalismo pode realmente funcionar.

Para geógrafo, organização das cidades pode ser também forma de controle social

Para geógrafo, organização das cidades pode ser também forma de controle social

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