A Aliança do Pacífico e seus progressos

O acordo de integração é o mais ambicioso e promissor das Américas

A Aliança do Pacífico (AP) é provavelmente o tema mais candente da atualidade na integração econômica da América Latina. Vejamos por quê. Criada há pouco mais de dois anos, ela prevê uma integração de grande envergadura entre Chile, Colômbia, México e Peru, e se tornou rapidamente o mais ambicioso e promissor acordo de integração nas Américas. Os encontros internacionais abordam o tema com grande interesse, como ocorreu na reunião do Fórum Econômico Mundial, no final de janeiro em Davos. Não é de se estranhar que 25 países tenham solicitado a condição de observadores da AP, entre eles Estados Unidos, Canadá, China e Japão, além de latino-americanos como Costa Rica, Panamá e Uruguai. A Costa Rica já formalizou sua solicitação de adesão à AP. Com um PIB combinado de mais de 2 trilhões de dólares, um mercado de 209 milhões de pessoas e quase 10.000 dólares de renda per capita, é um mercado muito interessante para os investidores locais e estrangeiros. Representa 35% do PIB da América Latina, maior que o Brasil em termos de população e produto interno bruto. E, como suas economias são muito abertas, a AP concentra mais de 41% do comércio da América Latina com o resto do mundo. Continuar lendo

O que realmente é o fascismo

por Lew Rockwell

Todo mundo sabe que o termo fascista é hoje pejorativo; um adjetivo frequentemente utilizado para se descrever qualquer posição política da qual o orador não goste.  Não há ninguém no mundo atual propenso a bater no peito e dizer “Sou um fascista; considero o fascismo um grande sistema econômico e social.”Porém, afirmo que, caso fossem honestos, a vasta maioria dos políticos, intelectuais e ativistas do mundo atual teria de dizer exatamente isto a respeito de si mesmos.O fascismo é o sistema de governo que carteliza o setor privado, planeja centralizadamente a economia subsidiando grandes empresários com boas conexões políticas, exalta o poder estatal como sendo a fonte de toda a ordem, nega direitos e liberdades fundamentais aos indivíduos e torna o poder executivo o senhor irrestrito da sociedade.

Tente imaginar algum país cujo governo não siga nenhuma destas características acima.  Tal arranjo se tornou tão corriqueiro, tão trivial, que praticamente deixou de ser notado pelas pessoas.  Praticamente ninguém conhece este sistema pelo seu verdadeiro nome. Continuar lendo

O brasileiro é um povo fútil?

por Diogo Costa

No relatório de consumo de países emergentes do Credit Suisse, o Brasil é o país com um consumo “discricionário mais prevalente”, o que é uma forma educada de dizer que gastamos mais dinheiro com futilidades do que outros países emergentes.Entre os brasileiros com uma renda de até U$1.000 (mensurada pela paridade do poder de compra), 62% dos participantes disseram que pretendem comprar roupa ou tênis “de marca” nos próximos 12 meses.  A proporção sobe para 74% entre os que ganham mais de U$2.000, maior do que nos demais países emergentes do relatório.Lembrando que, mesmo considerando a paridade de poder de compra, “roupa de marca” é mais cara aqui do que em outros países emergentes. Continuar lendo

Como ocorreu o milagre econômico de Hong Kong – da pobreza à prosperidade

Hong Kong, dias atuais

Com milhões de refugiados chineses, sofrendo com um embargo comercial e com sua infraestrutura estrangulada, a Hong Kong do início da década de 1950 parecia confirmar os prognósticos pessimistas feitos no século XIX.

No entanto, esta enxurrada de refugiados era composta por milhões de indivíduos que, embora completamente pobres, fugiram para Hong Kong em busca de liberdade.  E embora Hong Kong não possuísse a infraestrutura adequada para recebê-los, ela fornecia ampla liberdade para qualquer indivíduo que quisesse colocar seus talentos empreendedoriais em ação.

Não havia na ilha as mesmas restrições cambiais vigentes no Reino Unido e em grande parte da Europa — o que significava que o dólar de Hong Kong, que era ancorado à libra esterlina, era livremente conversível em outras moedas —, e a quantidade de regulamentações sobre a economia era desprezível.

A combinação entre mão-de-obra à procura de trabalho e empreendedores com conhecimento e algum capital oriundos de Xangai — até então a grande cidade capitalista chinesa — forneceu a matéria-prima para o crescimento industrial iniciado na década de 1950.  A economia começou a prosperar. Continuar lendo

ESPECIAL DAVID HARVEY – 3 entrevistas realizadas com o geógrafo em sua última passagem pelo Brasil

O marxista que quer reinventar as cidades (I)

David Harvey provoca, em longa entrevista: é hora de adaptar ambiente urbano ao tipo de gente que queremos ser

Entrevista a Vince Emanuele | Tradução: Sônia Scala Padalino

Se vivemos em cidades que nos infernizam e aprisionam, qual a causa de sua desumanidade? E, mais importante: que caminhos permitirão transformá-las? As respostas, para esta questão crucial, raramente coincidem. Às vezes, são genéricas demais e paralisam: núcleos urbanos insuportáveis seriam consequência necessária de um sistema que coloca o lucro acima dos seres humanos. Só o fim do capitalismo abriria espaço para novas cidades. Em outros casos, as respostas são muito pouco ambiciosas. Diante de adversários poderosíssimos – o poder econômico e uma política institucional cada vez mais impermeável às aspirações sociais – deveríamos nos concentrar em humanizar espaços restritos. Uma bairro, uma praça, uma horta comunitária.

Acaba de percorrer três cidades brasileiras – Rio, Florianópolis e São Paulo – David Harvey, um pensador que busca, há décadas, soluções para este impasse. Geógrafo, Harvey é também marxista. Para ele, portanto, o degradação das cidades está associada ao capitalismo. Continuar lendo

Democracia ou Capitalismo?

A democracia liberal foi derrotada pelo capitalismo e não me parece que seja derrota reversível. Portanto, trata-se de inventar nova democracia

Por Boaventura de Sousa Santos 

No início do terceiro milênio as esquerdas debatem-se com dois desafios principais: a relação entre democracia e capitalismo; o crescimento econômico infinito (capitalista ou socialista) como indicador básico de desenvolvimento e de progresso. Nesta carta, centro-me no primeiro desafio.

Ao contrário do que o senso comum dos últimos cinquenta anos nos pode fazer pensar, a relação entre democracia e capitalismo foi sempre uma relação tensa, senão mesmo de contradição. Foi-o certamente nos países periféricos do sistema mundial, o que durante muito tempo foi chamado Terceiro Mundo e hoje se designa por Sul global. Mas mesmo nos países centrais ou desenvolvidos a mesma tensão e contradição esteve sempre presente. Basta lembrar os longos anos do nazismo e do fascismo.

Uma análise mais detalhada das relações entre capitalismo e democracia obrigaria a distinguir entre diferentes tipos de capitalismo e sua dominância em diferentes períodos e regiões do mundo e entre diferentes tipos e graus de intensidade de democracia. Nesta carta concebo o capitalismo sob a sua forma geral de modo de produção e faço referência ao tipo que tem vindo a dominar nas últimas décadas, o capitalismo financeiro. No que respeita à democracia centro-me na democracia representativa tal como foi teorizada pelo liberalismo. Continuar lendo

As sementes do fascismo, no século 21

Polícia de SP ataca o Pinheirinho, em 2011: incapaz de integrar marginalizados à sua lógica, sistema passou a fustigá-los e deslocá-los permanentemente

Para retomar acumulação, em tempos de crise, capital ensaia estratégia particular. Inclui guerras, especulação financeira máxima e criminalização das “populações excedentes”  

Por William I. Robinson | Tradução: Taís Gonzalez

Em Policing the Crisis, clássico estudo conduzido, em 1978, pelo famoso socialista e teórico cultural Stuart Hall e alguns colegas, os autores mostram que a reestruturação do capitalismo, uma resposta à crise da década de 1970 – a última grande crise mundial do capitalismo até a de 2008 –, produziu, no Reino Unido e em todo o mundo, um “estado excepcional”. Significava um processo de ruptura com os mecanismos de controle social, então consensuais, e um autoritarismo crescente. Eles escreveram: Continuar lendo

O desafio de ser refugiado

Convivemos hoje com o maior contingente de refugiados na história da humanidade – 160 milhões de pessoas. São homens, mulheres e crianças deslocados por flagelos como guerras, perseguições políticas e religiosas, intolerância de natureza étnica e racial.

Washington Araújo

À medida que o mundo avança para o terceiro milênio e quando se torna inadiável uma nova configuração do ordenamento jurídico internacional, existe um contingente de cerca de 160 milhões de pessoas (equivalente a mais que quatro populações da Argentina) fora de seus países de origem. São os refugiados. Aqueles que foram forçados a fugir por recearem pela sua vida e liberdade, e que na maioria dos casos, abandonaram tudo – casa, bens, família e país – rumo a um futuro incerto em terras estrangeiras. Convivemos, neste limiar do século XXI, com o maior contingente de refugiados na história da humanidade. Um número tão impressionante que representa nada menos que o triplo do número total de refugiados registrados na Europa, no início do século 20.

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Pré-Sal, cobiça e poder global

Que interesses escondem-se atrás da “internacionalização” das jazidas brasileiras. Como ela está em andamento e quais os meios para revertê-la

Que interesses escondem-se atrás da “internacionalização” das jazidas brasileiras. Como ela está em andamento e quais os meios para revertê-la

Por Paulo Metri*

“O Pré-Sal pertence à humanidade” é a tradução do título do editorial do The New York Times que irá sair em um futuro não muito distante. A pregação diz que o Pré-Sal é da humanidade porque está em área do globo terrestre que não pertence a nenhum país. Logo após esta afirmação, o jornal lança o conceito de que quem chegar primeiro passa a ter a propriedade do petróleo e do gás produzidos. Estas são as teses principais do editorial, representando a opinião de fortes grupos de interesse do capitalismo internacional. Continuar lendo

O drama dos seres humanos ilegais — e como interrompê-lo

Antropólogo iraniano escreve sobre imigrantes, trabalhadores que o capital simultaneamente deseja e exclui. E aposta que controles migratórios podem se tornar obsoletos…

Por Roberto Almeida, no Opera Mundi

Hoje o iraniano Shahram Khosravi é antropólogo, professor da Universidade de Estocolmo. Mas há 30 anos ele era um imigrante sem documentos, pagando contrabandistas para ajudá-lo a fugir de sua terra natal. Ele peregrinou, deixou os dólares da família com policiais corruptos para escapar do serviço militar obrigatório, que o levaria ao front da guerra Irã-Iraque.

Khosravi transformou sua “rica” experiência em livro. ‘Illegal Traveller’ – An Auto-Ethnography of Borders (‘Viajante Ilegal’ – Uma autoetnografia de fronteiras, US$ 27, Amazon.com) é um guia de sobrevivência pelas linhas porosas que dividem o atlas global. “Fronteiras são símbolos e rituais de uma comunidade. Ter controle é mostrar a identidade e legitimidade do Estado”, disse o autor ao Opera Mundi.

Em meio à disputa de deportações entre Brasil e Espanha, que levanta suspiros patrióticos em ambos os lados, sem falar no limbo jurídico em que caíram imigrantes haitianos, que aguardam no Acre e em Rondônia documentação para trabalhar, Khosravi vê tudo como um grande “espetáculo” que prioriza a soberania de um país e se esquece das pessoas.

São palavras de um homem que viveu como “deportável” anos a fio até encontrar asilo político na Suécia, onde vive hoje. “Uma pessoa sem documentos não sabe o que vai acontecer amanhã. Tem medo até de se apaixonar”, contou. Veja a entrevista. Continuar lendo