Operação fronteira

Conheça ações e iniciativas do governo Federal e das Forças Armadas no processo de proteção do território brasileiro

Maurício Barroso

Maturacá (AM) – Em 2007, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, visitaram as instalações de fronteira do Exército na comunidade de Maturacá no município de São Gabriel da Cachoeira.

O Brasil é um país com dimensões continentais. Seus quase 17 mil quilômetros de extensão dividem-no com outros dez países, que passam por 11 Estados brasileiros. São regiões complexas e de intensa entrada e saída de mercadorias e pessoas, fluxo que torna a vigilância das fronteiras um desa o constante e primordial para a segurança nacional.

O contrabando de armamentos e drogas é um dos maiores problemas dessas divisas e, de olho na Copa das Confederações, que ocorrerá entre os dias 15 e 30 de junho, a presidenta Dilma Rousseff a rmou, em abril, na coluna semanal Conversa com a Presidenta, que uma grande operação militar será feita, em maio, ao longo dos 16 mil quilômetros de fronteira terrestre do País. “A segurança pública é uma responsabilidade constitucional dos Estados, mas o governo Federal tem o dever de participar na sua área de atuação e é isso o que estamos fazendo”, disse Dilma, que respondeu à pergunta de um ouvinte sobre a atuação das Forças Armadas no combate à entrada de drogas pela fronteira.

Dilma respondeu que as Forças Armadas e as polícias federais e estaduais trabalham de forma coordenada para combater os crimes nas fronteiras do País desde 2011, quando foi lançado o Plano Estratégico de Fronteiras. A presidenta explicou que a ação integrada é feita periodicamente, por meio da Operação Ágata, liderada pelo Ministério da Defesa, e pela Operação Sentinela, do Ministério da Justiça. “Juntas, elas já desarticularam 65 organizações criminosas, apreenderam 360 toneladas de drogas, 8 mil carros e embarcações e inspecionaram 148 pistas de pouso”, lembrou a presidenta.

As operações conjuntas objetivam salvaguardar um momento específico, mas os problemas das regiões de fronteira não são sazonais, e criar um “cinturão” que proteja o Brasil de Norte a Sul torna-se uma missão árdua e complexa para o exército brasileiro.

PODER DE POLÍCIA
Com o objetivo de melhorar essas ações, desde o ano de 1999, as Forças Armadas que operam nas divisas adquiriram poder de polícia, com a Lei Complementar (LC) nº 97 e posteriores alterações na LC nº 117 de 2004.

Para o professor de Geografia da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), Walfredo Bento Ferreira Neto, o artifício infraconstitucional terá sucesso, se os agrupamentos tiverem noção exata de suas funções e não incorrerem em arbitrariedade, desvio ou abuso de poder. Ferreira Neto defende, em seu artigo “O poder de polícia atribuído ao Exército Brasileiro na faixa de fronteira terrestre” (2009), a importância do conhecimento geográfico, geopolítico e também jurídico por parte das tropas baseadas nessas regiões. “É nesse novo cenário que os agentes representantes do Poder Público, em especial os militares do Exército Brasileiro, deverão atuar: cientes da extensão e das características geográficas da faixa fronteiriça do País e das repercussões geopolíticas e internacionais que essa área possui intrinsecamente”, observa o professor.

Ferreira Neto menciona Bandeira de Mello (2008, p.830) quanto à preocupação que o Poder Público e seus agentes devem ter ao se utilizarem do poder de polícia. De acordo com Mello, é preciso que a administração se comporte com extrema cautela, nunca servindo de meios mais enérgicos que os necessários à obtenção do resultado pretendido pela Lei, sob pena de vício jurídico que acarretará responsabilidade. “Sendo assim, além da Legalidade, a Proporcionalidade entre o meio e o  m dessas ações deverão servir constantemente como um farol norteador, principalmente aos que estiverem na função de comando”, analisa o professor. Ele reforça, a rmando que o conhecimento legal é o artifício que respalda as ações preventivas e repressivas necessárias ao cumprimento das atribuições subsidiárias do Exército na faixa de fronteira terrestre e dos limites impostos pela Lei.

Para de nir em quais momentos essas ações preventivas e repressivas podem ser utilizadas, foi publicada a Portaria nº 061, de 16 de fevereiro de 2005, do comandante do Exército, que caracteriza os principais delitos passíveis de prevenção e repreensão por parte das Forças Terrestres, que seriam crimes transfronteiriços e ambientais. O primeiro trata de alguns temas, como a entrada e saída ilegal no território nacional de armas, munições, explosivos e demais produtos a ns; o tráfico ilícito de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica; o tráfico de plantas e de animais; dentre outros. Já os delitos ambientais estão presentes na prática de atos lesivos à natureza e que são de punidos pela Lei de Crimes Ambientais, como a exploração predatória ou ilegal de recursos naturais e a prática de atos lesivos à diversidade e à integridade do patrimônio genético do País.

O professor lembra ainda, em seu artigo, que os delitos mencionados ocorrem com frequência, apesar de todo o aparato inibidor montado e em funcionamento nessa área fronteiriça. “Podemos citar, por exemplo, a região da Tríplice Fronteira [Brasil, Paraguai e Bolívia], uma das principais vias de acesso do tráfico de entorpecentes, do contrabando de armas e de descaminho, sem contar com insinuações de existência de células ligadas ao terrorismo internacional”, observa Ferreira Neto.

FAIXA DE FRONTEIRA
De acordo com a Constituição da República do Brasil de 1988: “A faixa de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei.” (Artigo 20, § 2o). Sendo assim, a partir da definição constitucional, tem-se os seguintes dados: – Extensão da faixa: até 150 km de largura, ao longo das fronteiras terrestres. – Finalidade: defesa do território nacional.Fonte: Walfredo Bento Ferreira Neto, em “O poder de polícia atribuído ao Exército Brasileiro na faixa de fronteira terrestre – um enfoque geográfico, geopolítico e jurídico”.
EXÉRCITO BRASILEIRO
“Cabe ao Exército Brasileiro, além de outras ações pertinentes, […]: IV – atuar, por meio de ações preventivas e repressivas, na faixa de fronteira terrestre, contra delitos transfronteiriços e ambientais, isoladamente ou em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, […].” (Artigo 17-A, inciso IV, da Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999).

Rio de Janeiro – Em outubro de 2012, o ministro da Defesa, Celso Amorim, e o comandante da Marinha, almirante de esquadra Julio Soares de Souza Neto, apresentaram, no 1º Distrito Naval, o navio patrulha oceânico “Amazonas”, incorporado à frota de fiscalização da “Amazônia Azul”

TRÍPLICE FRONTEIRA
A conhecida Tríplice Fronteira (TF) sempre foi uma área de grandes tensões e disputa de diferentes governos, mas, após os atentados de 11 de Setembro de 2001, ocorridos em território norte-americano, o que já era tenso  ficou pior, depois que setores do governo norte-americano identificaram que a região seria refúgio para agentes do terrorismo internacional, ou fonte de  financiamento das atividades de grupos islâmicos radicais em outras partes do mundo. “No que tange às Forças Armadas do Brasil, embora sua atuação esteja mais relacionada à contrainteligência, na busca de acompanhar, detectar, identificar e neutralizar as ameaças, em conversas com o ciais de alta patente, percebe-se que não há uma visão uni cada sobre a ameaçado terrorismo na região”, observou o doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Marcos Alan F. dos Santos Ferreira. Ele explica que, enquanto alguns o ciais de alta patente do exército consideram o terror um fenômeno global, que merece atenção especial, outros ligados a centros de inteligência das Forças Armadas mostram-se descrentes quanto a uma real ameaça terrorista na TF, tratando-a como mito. No estudo “A Política de Segurança dos Estados Unidos e a Tríplice Fronteira no pós 11 de setembro: uma análise dos interesses norte-americanos e o posicionamento brasileiro” (2010), o cientista político cita o trabalho do general Álvaro Pinheiro, do Exército brasileiro, no qual reconhece a preocupação com a divergência de visões sobre o tema dentro das forças militares.

De acordo com o general, após conversas com pessoas ligadas ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência e o ciais de centros de inteligência das Forças Armadas, a percepção geral é de que o problema maior da Tríplice Fronteira não é o terrorismo, embora exista algum temor com relação à atuação do grupo Jama’at Al-Tablighi em Foz do Iguaçu. A preocupação principal continua sendo o trá co de drogas, de armas e o contrabando. Cenário que, na percepção dos pesquisadores, cria impacto direto na segurança do Estado brasileiro, e não uma possível ameaça terrorista proveniente de grupos como Hizbollah, Hamas, Al-Qaeda ou Gama’at al Islamiyya.

Para Ferreira, além de as Forças Armadas brasileiras historicamente se mostrarem controversas em relação a uma cooperação mais estreita com o setor militar estadunidense, existe o fato de o combate ao terrorismo ultrapassar as funções tradicionais do Exército. “Como o poder de interdição policial e monopólio da força física em território nacional permanecem sob os auspícios da Polícia Federal (PF), será esta instituição que apresentará indicativos mais categóricos de atuação contra o terrorismo”, lembra o cientista político. Ele observa que a PF tem adotado estratégias para evitar a presença de membros de grupos terroristas no Brasil, como, por exemplo, maior controle em portos e aeroportos, intercâmbio de informações com serviços de inteligência de outros países e participação em reuniões conjuntas que visam à cooperação internacional no combate ao terror.

REGIÃO NORTE
A Bacia Amazônica apresenta características bastante diferentes daquelas observadas na Tríplice Fronteira, tendo em sua geografia dificuldades específicas no enfrentamento das questões de defesa e, especialmente, de segurança. “Além das ameaças presentes ao longo de toda a linha de fronteira, como o tráfico internacional de armas e drogas, na região amazônica, destacam-se as ameaças ao meio ambiente – queimadas, desmatamentos ilegais, biopirataria -, além da possibilidade de transbordamento de movimentos guerrilheiros na região”, explica o doutor em Ciências Políticas pela Universidade de São Paulo (USP) Oscar Medeiros Filho, autor da pesquisa “Entre a cooperação e a dissuasão: políticas de defesa e percepções militares na América do Sul” (2010).

Formosa (GO) – Lançamento de foguetes “terra-terra”, fabricados pela Avibrás, no Campo de Instrução de Formosa

No artigo, o cientista político analisa as distintas preocupações e atividades militares desempenhadas na região pelos países que compõem o entorno da Bacia Amazônica. De acordo com Medeiros, a importância do significado estratégico daquela região tem sido crescente nas últimas décadas, tendo repercutido diretamente no aumento dos gastos em defesa e na definição da identidade institucional dos exércitos da região. Cenário, segundo o autor, que é atraente para os militares.

Além de novos investimentos na estrutura local, o que atrai os militares é a ameaça, por eles percebida, de que a riqueza natural da Amazônia é cobiçada por grandes potências internacionais. “Essa percepção é bastante arraigada entre os militares de todos os países amazônicos”, explica Medeiros. Entretanto, ele faz uma ressalva, citando o trabalho “A Amazônia no Pensamento Militar Sul-americano” (2009), de Adriana Marques, o qual comenta as divergências no que tange à natureza dessa ameaça. “Enquanto venezuelanos e equatorianos, por exemplo, são mais veementes e acreditam na possibilidade de que os países industrializados, no futuro, possam invadir militarmente a Amazônia para tomar posse de suas riquezas naturais, colombianos e bolivianos argumentam que esses países, de fato, cobiçam o patrimônio natural da Amazônia, mas não teriam interesse, nem necessidade, de se utilizar de força para obtê-los, já que o fazem através da biopirataria”, diz a citação.

Sobre o problema relacionado aos ilícitos, Medeiros argumenta, em seu estudo, que as facilidades impostas pela geografia da região transpõem sem dificuldades as fronteiras nacionais. “A situação é ainda mais complexa, pelo fato de a sub-região abrigar os três países onde o cultivo e o processamento de drogas [cocaína] possuem especial importância: Colômbia, Peru e Bolívia”, analisa. Ele lembra que a fragilidade dos mecanismos de vigilância naquela área torna o ambiente regional inseguro.

As ameaças procedentes do narcotráfico têm imposto aos militares da região, segundo o cientista político, a necessidade de adaptação ao chamado “conflito de baixa intensidade”, com o uso de armas leves e o emprego maciço de tropas aerotransportadas, voltadas principalmente para as tarefas anti-insurgentes e antidrogas. “Isso se revela no tipo de compra de armamento que a Colômbia tem realizado ao longo da última década, o que inclui a aquisição de lanchas para patrulha fluvial, helicópteros e aviões leves Super Tucano A-29, fabricados pela Embraer”, cita Medeiros. Apesar da importância do combate ao narcotráfico na região, apenas a Colômbia emprega regularmente suas Forças Armadas com foco nesse tipo de ameaça. “Os demais exércitos amazônicos, sem desprezar as novas ameaças, elegem as missões clássicas como prioritárias. De qualquer forma, a natureza das ameaças presentes naquela sub-região tem levado os exércitos a desenvolver uma espécie de ‘doutrina dual’. Talvez um bom exemplo disso sejam as missões desempenhadas pelos Pelotões Especiais de Fronteira do Exército Brasileiro [PEF]”, comenta o cientista político, sobre a criação de 28 agrupamentos destacados para o enfrentamento naquela região.

POLICIAMENTO ESPECIALIZADO DE FRONTEIRAS (PEFRON)
Para auxiliar o combate aos crimes nas regiões de fronteira, foi criado, em 2008, o Policiamento Especializado de Fronteiras (Pefron). A partir de iniciativas como o Grupo Especial de Segurança de Fronteiras (Gefron), unidade criada pela Secretaria de Segurança Pública de Mato Grosso (Sejusp-MT) e o Departamento de Operações de Fronteira (DOF), iniciativa de Mato Grosso do Sul (MS), o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), decidiu incrementar o policiamento com uma nova iniciativa, desta vez de forma sistêmica e de âmbito nacional. Os objetivos do Pefron:1. Foco nas comunidades de fronteira e abrangência nacional.
2. Formação de Gabinetes de Gestão Integrada (GGI), que articulam estratégias locais e regionais.
3. Valorização profissional, com equipamentos e pagamento de gratificações para os policiais que atuarão nas faixas de fronteira.
4. Previsão de reinvestimento após o segundo ano de implantação do Pefron.
5. Articulação com ações das polícias federais (PF e PRF).
6. Articulação com ministérios (Fazenda, Saúde, Defesa, Meio Ambiente, Integração Nacional e Agricultura).
7. Curso de nivelamento pela Força Nacional.
8. Bases móveis com suporte de trabalho de perícia técnica (exames de laboratório) e de polícia civil.
9. Suporte aéreo e fluvial para ações itinerantes do Pefron.
10. Utilização de tecnologias não letais.
11. Novas alternativas tecnológicas para integração das comunicações.
12. Integração entre organismos estaduais e federais de segurança pública.

MILITARES INDÍGENAS
Uma dessas bases fica situada na fronteira do Brasil com a Colômbia: o Pelotão Especial de Fronteira de São Joaquim é a base militar mais remota da Amazônia brasileira. O inusitado é que grande parte dos cem militares que trabalham no pelotão é de origem indígena e, segundo o site de notícias BBC Brasil, em reportagem publicada em agosto de 2012, a contratação de índios para defender e patrulhar a floresta amazônica é uma tendência adotada pelo Exército brasileiro.

Ainda segundo a reportagem, os indígenas, atualmente, representam cerca de 70% dos 1,4 mil militares da 2a Brigada de Infantaria de Selva, que agrupa sete bases avançadas nas fronteiras com a Colômbia e a Venezuela, além de um complexo militar na maior cidade do extremo norte do Amazonas: São Gabriel da Cachoeira, de 38 mil habitantes.

O Exército brasileiro faz exposição de material militar, em comemoração ao Dia ao Soldado

Eles são recrutados entre os cerca de 30 mil índios de 14 etnias que habitam a região do alto Rio Negro. O pelotão foi instalado em 1988, para proteger o Rio Içana, que nasce na Colômbia e deságua no Rio Negro, no Brasil, e, apesar de não muito utilizado, é uma via de ligação fluvial entre os dois países.

Como motivação para a contratação dos índios, o general Luiz Sérgio Goulart Duarte destacou o fato de que eles são excelentes exploradores e guias. Além disso, o o cial enfatizou que o militar de origem indígena tem muita facilidade para realizar as tarefas relacionadas à vida e ao combate no interior da selva, por estar completamente integrado naquele ambiente.

Contudo, a facilidade dos índios de atuar nessas regiões pode ser interpretada como a falta de infraestrutura naquelas bases, já que, em matéria também publicada em agosto de 2012, o site jornalístico G1 (Organizações Globo) salienta que militares na fronteira vivem com comida racionada e luz por apenas nove horas.

De acordo com o tenente e subcomandante do Pelotão Especial de Fronteira de Bom m, que  ca na fronteira de Roraima com a Guiana, Renzo Silva, a maior dificuldade são apenas as nove horas de energia e também a demora para a chegada do material, levado uma vez por mês, em avião da FAB. O tenente contou à reportagem que houve uma ocasião na qual o avião atrasou dois meses e o grupo teve que fazer racionamento.

Fonte: http://conhecimentopratico.uol.com.br/geografia/mapas-demografia/49/artigo290227-1.asp

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